Uma viagem

Em uma viagem levo-me comigo apenas, porque bagagens são acessórios. O que levarei na morte, viagem tão grande quanto à chegada? Os recursos que me faltam para respostas, me excedem à certeza de que me levo apenas. Sem bagagens como as que têm aqui, mas com as experiências... Coisas sem as quais não me faz sentido ter existido e não as levar para algum lugar.

Eu, que penso na morte como uma amiga, ficaria muito surpreso se essa passagem não levasse a nada. Ou ainda mais se levasse. Porque nada depois da morte é um desaforo que cala uma humanidade toda e que fragmenta a vida pondo-a no limite de 70 ou 80 anos. Às vezes me parece possível tal desacordo. Afinal, não é tudo possível, quando não se sabe ao certo o que é o que?

Em uma viagem me transporto, naquela viagem sou transportado na melhor das hipóteses. Pode não ser o melhor dos assuntos, mas não entendo como se pensa tão pouco nisso. Ao menos se fala pouco! E tocar no assunto é como um desvario. É mal interpretado, sempre.

Ao mesmo tempo, como contradizendo isso, não faltam explicações para onde vamos. Mas a grande maioria não tem comprovação. Isso é que nos mata antes do tempo. Porque essa dúvida põe em cheque tudo o que poderíamos ter feito de bom e de ruim nessa vida. Faz-nos pensar nas convenções de que talvez nunca tenhamos precisado, mas que norteiam nossa vida.

Não ter ao certo o que nos sucede é como se nos privassem de viver cada fôlego dessa existência como se merece. É tão trágico que as pessoas preferem mudar de assunto.