O MEIO AMBIENTE INTEIRO - PARA AUGUSTO RUSCHI

O MEIO AMBIENTE POR INTEIRO – SOBRE AUGUSTO RUSCHI

O homem o que é? É parte do planeta ou nele um corpo estranho? O homem sente-se integrado no meio ambiente ou é dele apenas um apêndice? Parece que alguns se imaginam feitos de um produto estranho ao planeta, como se não fosse afetado por problemas que no mundo ocorra. Augusto Ruschi é um desses homens que colocam os homens no seu devido lugar dentro do planeta. Daqueles que, mesmo a contragosto de muitos, nos provam que somos um conjunto único, como que um único ser vivo, o planeta, do qual somos parte ativa e viva, como membros de um corpo. Seu trabalho e sua obra, carregada da paixão pelo ecossistema, nos faz ver que, como um corpo, se atingimos uma parte dele, a dor se faz sentir como um todo.

Augusto Ruschi é um brasileiro como poucos. Um terráqueo raro deste imenso planeta, que se misturou a ele de forma a com ele se confundir, a ponto de oferecer a vida para defende-lo. Definir esse homem é difícil, assim como identificar sua especialidade. Homem profundamente culto, era capaz de ser professor universitário e morar durante cinqüenta anos no meio da mata. Era realmente um homem integrado com a terra, e com ela se confundia. Tornou-se parte do meio ambiente, da fauna e da flora. Se assim o podemos dizer, especializou-se no estudo dos beija-flores, que acreditava, o levaria um dia ao céu.

Um outro aspecto que gostaria de destacar na vida de Augusto Ruschi é o seu lado político. Penso que este aspecto é um dos mais interessantes, visto que, a política é o espaço onde se pode provocar mudanças efetivas. Sua forte personalidade trouxe para o Brasil e para o mundo características relevantes e a influencia que hoje faz o mundo pensar. Interessante que em sua época, pouco se falava da preservação e o mundo não tinha ainda despertado para as questões ambientais em âmbito global. Não se falava de aquecimento global, de degelo de calotas polares, de camada de ozônio. Mal se falava de efeito estufa e de problemas ambientais sem, no entanto, provocar o debate que hoje envolve toda a sociedade e seus segmentos.

Augusto Ruschi chama-nos, já em seu tempo para os perigos de adubos químicos e agrotóxicos. Hoje os males desses perigosos elementos que o homem utiliza cotidianamente são amplamente discutidos e também se buscam soluções alternativas para que tenhamos uma vida mais saudável. As reservas florestais e ambientais devem muito a Ruschi o fato de existirem em todo o mundo. Foi ele um dos incentivadores das mesmas e as reservas transformaram-se numa das mais bem sucedidas políticas de preservação do meio ambiente. Chama-me a atenção em sua biografia a incorporação do elemento florestal em sua vida. Quando se mandou destruir a reserva de Santa Lúcia, ele em pleno governo militar, enfrentou com armas em punho a floresta. Ele fazia parte dela e por isso não permitiu que lhe atacassem, pois seria o mesmo que atacassem o seu corpo. Na minha opinião, essa é a maior contribuição de Augusto Ruschi. Não de ter pegado em armas para que a natureza fosse defendida, mas no sentido de que ele era a terra e a terra era ele. Se o homem conseguir compreender essa idéia, pronto, o planeta está salvo. Ninguém arranca um dedo para transformar em lucro, para vender ou para se fabricar um produto qualquer. Claro, porque dói e esse dedo vai fazer falta ao seu dono, é parte dele. Assim Augusto Ruschi se sentia com relação à terra e é isso que devemos também sentir. O homem é terra, o homem é a natureza em seu conjunto global.

Além do mais, as matas e as reservas escondem vidas, vidas tão importantes quanto as nossas. Animais, insetos, plantas, e muitos deles que vão contribuir para o bem da sociedade, bem como muitos outros que já deram sua contribuição. Essa riqueza é objeto de cobiça do mundo todo, e parece que o Brasil não entendeu isso ainda. Se todos querem apoderar-se de nossa riqueza ambiental, é porque seu valor é incrivelmente grande. Pesquisadores estão sempre buscando alternativas medicinais que possam transformar a vida das pessoas. Ruschi estava muito à frente desses pesquisadores. Enfermo, passou por um ritual de purificação, a pajelança, após o fracasso da medicina convencional para se livrar de doenças adquiridas em suas andanças. Este ritual trouxe alívio ao pesquisador e evidenciou ainda muito mais, sua ligação estreita com a terra e com os seres que nelas habitam. Se a humanidade trouxesse para sua alma este ensinamento, os problemas ambientais que estamos vivendo e os piores ainda, que estão sendo anunciados, seriam certamente revertidos.

O lado humano da Terra está ficando pra depois, está se tornando apenas um detalhe dentro da fome de lucro e da sede de progresso. O progresso chega cada vez mais veloz e feroz, devorando a vida de milhares de pessoas inocentes. Por ironia do destino, os Estados Unidos, maior poluidor do planeta, com consciência de poluidor e sem o menor senso de culpa ou de vontade de mudar de atitude, estão sofrendo gravíssimas conseqüências, devido à fúria da natureza que a cada ano vem devastando regiões importantes e populosas daquele país, sem contar as alterações climáticas que esse país enfrenta.

O mundo sofre as conseqüências, mas as previsões são catastróficas para todos os seres vivos, sendo que para a África, continente mais pobre, as previsões são desastrosas. E mais que em outros lugares. Agravado com a pobreza da imensa maioria desse continente só podemos esperar o caos, caso a situação não seja revertida. Augusto Ruschi estaria lá na África se estivesse ainda entre nós. Estaria ele lá, solidário com os povos. Talvez com a arma em punho como em Santa Lúcia, estaria ele presente em todas as conferencias ambientais em todo o mundo com sua voz a dizer “Aqui não. Em defesa da natureza eu sou capaz de matar ou morrer”. Ao conviver com os índios latino-americanos Ruschi descobriu a humanidade. A humanidade na sua essência, a humanidade-terra, a humanidade-natureza, profundamente enraizada uma na outra.

Aliás, importante destacar também o lado humano de sua pesquisa. Os índios também foram objeto de seu trabalho e admiração. Através de suas andanças ele conviveu de perto com inúmeros índios e suas cultura e sabedoria milenares, sendo eles depositários de um conhecimento que não estão nos livros nem sob o domínio dos grandes cientistas. Seus conhecimentos sobre plantas que curam e sobre a natureza, o funcionamento do mundo, estações do ano, ambiente são frutos de sua incorporação à terra e de sua mistura a ela.

O trabalho de Augusto Ruschi hoje rende frutos. Talvez ainda não com a intensidade que se deveria ou com a clareza que se espera. Hoje o Estado tem seus órgãos de defesa do meio ambiente. Desde as secretarias e departamentos existentes nos municípios ao ministério nacional. Não haveria esse nível de consciência sem o trabalho do nosso cientista dos beija-flores.

A política ambiental é destaque no mundo. O Brasil vem desenvolvendo atividades na área que merecem destaque. Mesmo sabendo que a Amazônia continua sendo desmatada, as ações lá desenvolvidas e a integração do homem à mata com desenvolvimento sustentável. As prefeituras também desenvolvem ações interessantes, na preservação de suas nascentes, de seus rios e em ações menores, de coleta de lixo e de conscientização da população. As escolas trabalham maravilhosamente bem as questões ambientais, principalmente com as crianças, que aprendem rápido e já vem sendo um diferencial que traz esperança para o mundo e a resolução de seus problemas. As crianças, livres das idéias capitalistas e do lucro fácil, conseguem enxergar que só poderão viver nesse mundo se dele cuidar com carinho, como se fosse sua própria casa. Não chegam a ser tão grandes as ações como as de Augusto Ruschi, mas são ações. E como tais, extremamente importantes. São as pequenas ações, que acredito eu, irão salvar o nosso planeta.

Mas nem tudo são tragédias. Nem tudo são trevas. Há luzes no fim do túnel. E elas podem crescer e iluminar as trevas que hoje nos circundam. Basta que para isso a nova geração venha com nova consciência, o que parece que está acontecendo. Quero ser otimista, quero ser alguém que acredita. Penso ser um passo importante acreditar na própria humanidade. E mesmo parecendo tão simples e estando tão repetitivo, vale a pena cuidar do seu espaço doméstico, do seu microcosmos. Utilizar os recursos naturais com cuidado e com zelo, entendendo que a água não é sua, está apenas em sua casa para seu uso, e que a energia que você consome é para manter um nível de conforto e para o funcionamento dos mecanismos da vida moderna. Nunca abuse dos recursos à sua disposição. Não faltará pra você nem pra ninguém se soubermos dividir e utilizar bem. São grãos de areia, ou lembrando de Augusto Ruschi e seus beija-flores, são as gotas de água que um deles carregava a longa distância para apagar um incêndio em sua mata, enquanto leões e elefantes fugiam. Mesmo consciente de que não salvaria sua casa, fazia sua parte. E faria o possível até seu fim. Incansavelmente. Que cada ser humano seja um beija-flor, e assim chegaremos ao céu.

LUCAS FERREIRA MG
Enviado por LUCAS FERREIRA MG em 13/05/2011
Código do texto: T2967775
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