RONDON - O DESBRAVADOR DOS SERTÕES

DESBRAVANDO O BRASIL – SOBRE MARECHAL RONDON

O homem do Brasil desconhecido descobre e redescobre o Brasil. Assim é Cândido Mariano da Silva Rondon, nascido no Mato Grosso, na cidade de Mimoso, em maio de 1865. Ainda no Brasil Império, o Mato Grosso era um lugar pouco conhecido, um sertão a ser ainda desbravado e com uma população bem reduzida. Rondon formou-se professor primário muito jovem, profissão que deixou para ingressar na carreira militar logo na sua adolescência, e a partir daí, tornou-se um grande homem com uma grande importância para a Pátria brasileira.

Rondon perdeu os pais muito cedo e pouco depois se transferiu para o Rio de Janeiro. Descendente de indígenas por parte de seus bisavós esteve ao lado dos grandes idealistas e dos homens que fizeram o Brasil republicano e ao mesmo tempo ao lado dos homens habitantes primeiros desse país, os índios. Viveu momentos intensos da história brasileira. Nasceu ainda no período da escravidão, viveu o nascimento da República, fazendo parte dela de forma ativa, ao lado de Benjamin Constant. Como militar, Rondon foi encarregado diversas vezes de trabalhos desbravadores no oeste brasileiro, de instalar linhas telegráficas, ligando pontos extremos do país, definindo e demarcando as fronteiras brasileiras. Seria apenas mais um nessa tarefa, não fosse o seu grande diferencial de apoio aos índios e de sua consciência de preservação da paz e harmonia com nossos primeiros habitantes. Ele desenvolve uma cultura de respeito e solidariedade com os povos indígenas, praticamente inédito no Brasil. Encontra-se e entra em contato com inúmeras e desconhecidas nações indígenas deste vasto território desconhecido do oeste e norte brasileiros. Além do mais, Rondon “amplia” o território brasileiro, visto que seu trabalho vai de encontro às fronteiras, aos pontos extremos, ligando o Brasil de norte a sul e diminuindo as distâncias e integrando as diversas partes desse país tão imenso.

Rondon vive num mundo completamente diferente do nosso. Hoje, respeitar as diferenças é quase um dogma, é algo muito comentado em todos os meios e algo que se aprende na escola desde criança. Não respeitar hoje é que não é normal. Mas nosso marechal vive numa época em que o índio não era personagem principal de história nenhuma e uma etnia pouco valorizada. Por isso ele chama tanto a atenção. Rondon, ao prestar serviços para o Brasil vai rasgando o território e no caminho tendo um contato próximo com os indígenas de inúmeras nações. Sensibilizado pelas questões indígenas, torna-se o maior defensor da humanidade indígena. Tinha como objetivo principal não matar nunca, retratado em sua máxima: “Morrer, se preciso, matar, nunca”. Nem mesmo quando foi atacado à flechadas e o exército que o acompanhava pedia vingança. Rondon explicava que os indígenas não nos odeiam naturalmente, mas sim, ficavam na defesa, visto que, os primeiros brancos retiraram-lhes a cultura e a vida de muitos de seus membros.

Foi um ativista não apenas teórico, mas prático. Foi o primeiro diretor do SPI, Serviço de Proteção aos Índios, órgão criado para defender os direitos dos povos indígenas. Era antes de tudo um humanista e pacificou inúmeras nações. Também por eles era respeitado, praticamente como um membro das nações pacificadas. Inteligente e astuto, Rondon tinha sempre um acompanhante especial que registrava suas expedições em imagens, que ficaram para a posteridade, num riquíssimo conjunto de documentários, gravados a partir de equipamentos de última geração. O resultado dessas filmagens foram exibidas até mesmo na Europa, o que tornou Rondon conhecido no mundo todo. Era mesmo um visionário, um homem que, talvez por ver um país tão grande, olhava para o horizonte aberto e percebia que o mundo vai muito além daquele que está ao nosso redor.

O trabalho desse grande homem, demarcando territórios, principalmente a partir dos levantamentos cartográficos desenvolvidos por ele com uma precisão impressionante, como se tivesse sido feito via satélite. Rondon chegou à Amazônia e mostrou aos brasileiros o tamanho do seu país. Mostrou ainda quem são os brasileiros, mostrando-nos que temos muitas caras.

Sua relação com os indígenas foi tão intensa que, Rondon foi incorporado ao povo indígena, sendo que era convidado de honra em celebrações fúnebres e quiseram mesmo que ele tivesse um enterro com uma tradição dos povos bororo, com quem se identificava mais. No entanto, apesar de sua profunda inserção no meio indígena, sabia da sua condição de homem da cidade e da preocupação com sua família. Foi enterrado no Rio de Janeiro. Sua preocupação com os povos indígenas não era apenas de não matar ou deixar os índios em sua vida isolada. Respeitar, conhecer, apoiar e possibilitar o crescimento das populações indígenas, Rondon via nelas nações e povos diferentes entre si, mas igualmente brasileiros.

O pensamento de Rondon remonta aos dias atuais, com os organismos hoje existentes como a FUNAI (Fundação Nacional do Índio) e o CIMI (Conselho Indigenista Missionário – ligado à Igreja Católica). São frutos do antigo SPI, gerenciados por ele. Também o respeito constitucional a esses povos e todas as iniciativas são devidos à política humanitária de Rondon.

Seus seguidores, sertanistas e indigenistas estão ainda no Brasil, atuando junto às frentes de trabalho nas aldeias, para garantir o direito que os índios hoje possuem consciência plena. Por isso, Rondon foi agraciado com vários prêmios internacionais, sendo indicado até mesmo para o Nobel da Paz, o que não se concretizou devido ao seu falecimento, em 1958 com quase 93 anos de idade. Não podemos deixar de citar o nome da unidade da federação chamada de Guaporé, sendo substituída por Rondônia em sua homenagem, talvez uma das maiores já prestadas a um homem brasileiro.

Os índios de fato são o principal legado de Cândido Rondon. A organização que esses povos hoje tem, devem muito à atuação desse homem. Ele os fez perceberem-se enquanto brasileiros dignos de direito e à sobrevivência com os parâmetros da agricultura e pecuária, com direito à assistência e amparo do Estado brasileiro, do qual são guardiões.

Sem esse homem, indiscutivelmente, o Brasil estaria uns cinqüenta anos atrasados. Foi um pioneiro em tudo o que fez e possibilitou aos brasileiros ver o Brasil que quase ninguém conhecia. Mostrou-o ao mundo, através dos seus vídeos produzidos e projetou o Brasil com a visita do ex-presidente dos Estados Unidos, Roosevelt. Verificou pessoalmente as fronteiras dessa imensa nação e integrou o país de norte a sul. Os seus habitantes isolados, respeitados e tratados com dignidade absoluta, chegando a ser praticamente um bororo, que o convidou para morar com essa nação para envelhecer e morrer lá. Um homem à frente do seu tempo, um homem sem medo de enfrentar o desconhecido e sem medo de encarar sua missão, por mais difícil que fosse. Não deve ter sido nada fácil desbravar sertões não conhecidos e aguardar os contatos amistosos com os índios a quem ele se recusava machucar. Fenomenal. É o homem da coragem, o soldado a vida toda, o patriota sempre, o humanista convicto, o humano em corpo e alma. O brasileiro completo, em toda a plenitude do termo, em toda a extensão de seus significados vários. O homem do século XXI vivendo no século XX.

Que seu exemplo possa nos convencer de que é possível fazer, com paciência e com respeito o Brasil que todos queremos, onde caibam todas as pessoas, de todas as etnias, de todos os costumes e crenças. O Brasil dos brasileiros, sem exceções.

LUCAS FERREIRA MG
Enviado por LUCAS FERREIRA MG em 13/05/2011
Código do texto: T2967771
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