Eu tinha 18 anos e parece que foi ontem
Por: Ivonete Almeida de Jesus
Vi minha vida passar pela janela de um trem… Aos 30 anos já pude perceber que a fragilidade física me tomava aos poutos, juntamente com o medo das transformações que a idade ia me proporcionando, sem que eu as desejasse. O rosto jovem, resplandecendo o desabrochar da adolescência, aos poucos dava lugar às discretas rugas no canto do olho, que me preocupavam a cada sorriso; meus cabelos sedosos e castanhos abriam espaço para vários fios brancos, indiscretos, que iam aparecendo a cada dia. Lembro-me de quantas vezes me olhava no espelho e fazia exercícios no rosto para frear as ações do tempo.
Se pudesse, compraria aqueles “cremes milagrosos” para rejuvenescer ou para impedir que o tempo me roubasse o vigor e a beleza da mulher jovem, sensual, que sempre fui.
Mais uma piscada de olho e o tempo parece que voou. Pela primeira vez recebi a tão sonhada aposentadoria. Trabalhei feito uma condenada durante 30 anos. Em muitos momentos desejei me descansar de toda aquela luta, e o melhor: ter de volta toda a contribuição que fiz ao INSS. Agora pego o mísero salário mínimo. Parte dele ficará na farmácia para pagar os medicamentos; com a outra pagarei a “minha casa, minha vida”. Só vai sobrar uns trocados para a alimentação. E o pior é que a todo momento tem alguém perto de mim, me olhando, como se eu fosse uma carteira recheada de cédulas. Tenho medo das “saidinhas bancárias”, quando podem me tirar o sustento e a dignidade.
Ah, pelo menos existe o Estatuto do Idoso…
Na cidade em que moro faz um calor quase infernal. Para ir ao centro só posso ir de ônibus. Nem as pernas nem o sol me permitem caminhar muito. Ainda bem que, na minha idade, eu já não pago mais passagens no transporte coletivo. Em compensação, tenho que rezar para encontrar uma poltrona livre, mesmo tendo a garantia prevista em lei. Nos dias de feira, ao chegar ao ponto, com uma sacola que mal consigo segurar por causa dos problemas nos ossos, amargo por vários minutos e até mais que uma hora. Passa um ônibus e não para; passa outro e o motorista finge que não me vê; outro para, mas o motorista me diz que não tem lugar nas poltronas exclusivas. Será que tenho que pagar para entrar? Nem questiono, só penso comigo mesma e desisto de entrar no carro lotado. Finalmente, consigo embarcar, mas o motorista arranca com pressa e eu me machuco ao cair na poltrona. Para completar, ele me olha e diz:
– Este é o mal dos idosos: são todos frouxos.
Fonte: Galinha Pulando
Por: Ivonete Almeida de Jesus
Vi minha vida passar pela janela de um trem… Aos 30 anos já pude perceber que a fragilidade física me tomava aos poutos, juntamente com o medo das transformações que a idade ia me proporcionando, sem que eu as desejasse. O rosto jovem, resplandecendo o desabrochar da adolescência, aos poucos dava lugar às discretas rugas no canto do olho, que me preocupavam a cada sorriso; meus cabelos sedosos e castanhos abriam espaço para vários fios brancos, indiscretos, que iam aparecendo a cada dia. Lembro-me de quantas vezes me olhava no espelho e fazia exercícios no rosto para frear as ações do tempo.
Se pudesse, compraria aqueles “cremes milagrosos” para rejuvenescer ou para impedir que o tempo me roubasse o vigor e a beleza da mulher jovem, sensual, que sempre fui.
Mais uma piscada de olho e o tempo parece que voou. Pela primeira vez recebi a tão sonhada aposentadoria. Trabalhei feito uma condenada durante 30 anos. Em muitos momentos desejei me descansar de toda aquela luta, e o melhor: ter de volta toda a contribuição que fiz ao INSS. Agora pego o mísero salário mínimo. Parte dele ficará na farmácia para pagar os medicamentos; com a outra pagarei a “minha casa, minha vida”. Só vai sobrar uns trocados para a alimentação. E o pior é que a todo momento tem alguém perto de mim, me olhando, como se eu fosse uma carteira recheada de cédulas. Tenho medo das “saidinhas bancárias”, quando podem me tirar o sustento e a dignidade.
Ah, pelo menos existe o Estatuto do Idoso…
Na cidade em que moro faz um calor quase infernal. Para ir ao centro só posso ir de ônibus. Nem as pernas nem o sol me permitem caminhar muito. Ainda bem que, na minha idade, eu já não pago mais passagens no transporte coletivo. Em compensação, tenho que rezar para encontrar uma poltrona livre, mesmo tendo a garantia prevista em lei. Nos dias de feira, ao chegar ao ponto, com uma sacola que mal consigo segurar por causa dos problemas nos ossos, amargo por vários minutos e até mais que uma hora. Passa um ônibus e não para; passa outro e o motorista finge que não me vê; outro para, mas o motorista me diz que não tem lugar nas poltronas exclusivas. Será que tenho que pagar para entrar? Nem questiono, só penso comigo mesma e desisto de entrar no carro lotado. Finalmente, consigo embarcar, mas o motorista arranca com pressa e eu me machuco ao cair na poltrona. Para completar, ele me olha e diz:
– Este é o mal dos idosos: são todos frouxos.
Fonte: Galinha Pulando