O REGRESSO AO PARQUE DE CAMPISMO
Está fresca esta noite de Verão em terras de além-Tejo bem juntinho ao litoral.
Daqui não se vê mar mas ouvem-se as ondas a bater mais lá ao fundo. O céu, que queria ver estrelado, está nublado e a humidade envolve os pinheiros com um véu translúcido.
Aos poucos foram-se apagando as luzes das outras caravanas e há um silêncio quase absoluto não fossem as ondas a bater no antigo molhe.
Há anos que cá não vinha.
A caravana está velhinha e a degradar-se.
Por aqui passaram hordas de netos e filhos, de Verão e de Inverno. Aqui viveram os meus pais anos a fio, fugidos do frio do norte onde têm uma casa enorme em pedra com mais de 4 séculos e terrenos que a circundam. Tudo isso está abandonado; o meu pai morreu e depois disso a minha mãe fixou-se perto de Lisboa. Nós, os filhos, não temos raízes por lá e não temos condições financeiras para obras de restauro e manutenção.
Aqui nos juntávamos os irmãos quase todos, com alguma frequência.
Aqui nos lamentávamos das desditas da vida ou, a maior parte das vezes, das alegrias que ela nos proporcionava.
Aqui os primos brincaram e zaragatearam.
Aqui jogámos partidas de canasta como se fossem os últimos dias das nossas vidas...
Aqui chorámos a morte do nosso pai.
Aqui recordámos uma outra vida que foi a nossa e já não é.
Agora só a nossa mãe, teimosamente, aqui vem passar uns dias por ano.
Mas ela está a ficar cada vez mais velhinha como é natural, e talvez esta seja a última vez que aqui fique sozinha. Foi por isso que me decidi a vir cá passar uns dias com ela apesar do meu desconforto físico.
Sei que fiz bem em vir. É mais uma etapa da minha vida que talvez se encerre agora.
Estou cansada deste registo: o desfazer da casa do norte, a da Família. O desfazer da minha casa de Alverca. Não tarda, o desfazer desta caravana...
Sei que fiz bem em vir mas agora estou com algo a apertar-me a garganta... É nostalgia. Ou talvez seja o frio húmido... ou o sono, o cansaço... Desculpas, digo eu, para justificar esta angústia...
Há fotografias dos meninos todos pelas paredes. Bem perto de mim está uma dos meus, tão bebés ainda, de calções e pernitas de aranha muito morenas do sol! O Ricardinho com a cabeça cheia de caracolinhos aloirados, ele que se fez um homem mais moreno que o irmão! Homens e mulheres! Estão todos homens e mulheres, os nossos meninos... Quase todos casados. Alguns já com os bebés deles!
E é assim que se vive: com recordações (boas e más), com alegrias passadas e presentes, com arrelias também. E sempre com muita saudade. Saudade do que fomos, saudades uns dos outros.
Texto lamechas? Sim, sem dúvida! Sou humana apenas...
Está fresca esta noite de Verão em terras de além-Tejo bem juntinho ao litoral.
Daqui não se vê mar mas ouvem-se as ondas a bater mais lá ao fundo. O céu, que queria ver estrelado, está nublado e a humidade envolve os pinheiros com um véu translúcido.
Aos poucos foram-se apagando as luzes das outras caravanas e há um silêncio quase absoluto não fossem as ondas a bater no antigo molhe.
Há anos que cá não vinha.
A caravana está velhinha e a degradar-se.
Por aqui passaram hordas de netos e filhos, de Verão e de Inverno. Aqui viveram os meus pais anos a fio, fugidos do frio do norte onde têm uma casa enorme em pedra com mais de 4 séculos e terrenos que a circundam. Tudo isso está abandonado; o meu pai morreu e depois disso a minha mãe fixou-se perto de Lisboa. Nós, os filhos, não temos raízes por lá e não temos condições financeiras para obras de restauro e manutenção.
Aqui nos juntávamos os irmãos quase todos, com alguma frequência.
Aqui nos lamentávamos das desditas da vida ou, a maior parte das vezes, das alegrias que ela nos proporcionava.
Aqui os primos brincaram e zaragatearam.
Aqui jogámos partidas de canasta como se fossem os últimos dias das nossas vidas...
Aqui chorámos a morte do nosso pai.
Aqui recordámos uma outra vida que foi a nossa e já não é.
Agora só a nossa mãe, teimosamente, aqui vem passar uns dias por ano.
Mas ela está a ficar cada vez mais velhinha como é natural, e talvez esta seja a última vez que aqui fique sozinha. Foi por isso que me decidi a vir cá passar uns dias com ela apesar do meu desconforto físico.
Sei que fiz bem em vir. É mais uma etapa da minha vida que talvez se encerre agora.
Estou cansada deste registo: o desfazer da casa do norte, a da Família. O desfazer da minha casa de Alverca. Não tarda, o desfazer desta caravana...
Sei que fiz bem em vir mas agora estou com algo a apertar-me a garganta... É nostalgia. Ou talvez seja o frio húmido... ou o sono, o cansaço... Desculpas, digo eu, para justificar esta angústia...
Há fotografias dos meninos todos pelas paredes. Bem perto de mim está uma dos meus, tão bebés ainda, de calções e pernitas de aranha muito morenas do sol! O Ricardinho com a cabeça cheia de caracolinhos aloirados, ele que se fez um homem mais moreno que o irmão! Homens e mulheres! Estão todos homens e mulheres, os nossos meninos... Quase todos casados. Alguns já com os bebés deles!
E é assim que se vive: com recordações (boas e más), com alegrias passadas e presentes, com arrelias também. E sempre com muita saudade. Saudade do que fomos, saudades uns dos outros.
Texto lamechas? Sim, sem dúvida! Sou humana apenas...