UMA BELA TRÍADE DE SONETOS

Caro amigo do “Recanto das Letras” e do jornal “Kanindé Cultural”, poeta Sílvio Roberto, você me sugere uma árdua incumbência – comentar-lhe uma trilogia de sonetos.

Recebi-os há dias, mas meu tempo não tem sido bem administrado. E somente hoje estou a lhe dar o ar da graça.

Mas, por favor, não entenda as linhas infra nem como crítica nem como um laudo literário. Não sou, mas não serei e jamais fui um crítico da Literatura.

O primeiro da trindade é um decassílabo clássico, com versos heroicos e sáficos, estruturado em um esquema rímico em ABBA, ABBA; CCD, EED.

Ao meu entendimento, modesto parecer de um leigo – apenas sou um simples escrevinhador de linhas – tudo vem a calhar nos conformes; um soneto de cunho amoroso, onde a incerteza do eu - poético do autor é um fato verdadeiro, lá no fecho do texto.

Em NOTURNO, texto mais descritivo e menos conceitual que o primeiro, as duas quadras seguem o mesmo esquema métrico e rímico do primeiro poema.

Apenas os tercetos assumem aspecto diverso, a saber: CDC e EDE.

Ambos são sonetos filiados ao cânon da poética tradicional, por isso mesmo com o merecimento de muito respeito, em tempos de tanta liberalidade na messe da poesia.

SONETO DE VÉSPERA, o terceiro do bloco, a exemplo dos anteriores leva o mesmo diapasão quanto à métrica, ou seja, versos decassílabos, e nos dois quartetos levando o mesmo esquema rímico.

No entanto, a mostrar quão o poeta é um mutante, criativo e versátil, os tercetos apresentam esquema novo, qual seja – CDD e CEE.

Louvável e apreciável o desempenho do bardo canindeense, em tecendo poemas de feição tão nobre e de escol quanto é o soneto.

Composição que vem de, aproximadamente, 1189, lá na Idade Média, segunda metade do século XII, o soneto tem forma fixa e é e será sempre um gênero de composição mui bem-vindo.

Haja vista a safra deixada, sobretudo, por Vinícius de Moraes e tantos modernistas e pós-modernistas brasileiros e lusitanos.

Aqui, na tríade em foco, o Autor martela seus versos com primorosa p e r f o r m a n c e, sem enveredar pelos modismos muitos dos quais sem pé nem cabeça, que andam por aí, como que a disputar uma auto-afirmação nem sempre bem sucedida, com exceção dos titãs da Semana de Arte Moderna, de 1922, além de muitos dos seus seguidores.

Não sou e nunca me dei ao luxo nem à veleidade de bancar o que não sou: um crítico literário. Falo como leigo, nesse meu nobre disparate de “crítico”, portanto com a liberdade total de asseverar e arrevesar as mais crassas asneiras.

No caso dos sonetos do poeta Sílvio Roberto, devo, a bem da verdade, e sem favor algum, lavrar-lhe um laudo deveras favorável.

O poeta é, aqui, na feliz tríade de sonetos, sem dúvida alguma, um ótimo artesão do verso, um sonetista que certamente irá às lonjuras na seara das poesias cearense e brasileira.

Um abraço, caro poeta Sílvio Roberto, afinado vate da linda e místico-religiosa cidade de Canindé, CE.

Fortaleza, 05 de julho de 2010.

João Gomes da Silveira

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SONETOS DA AUTORIA DE SÍLVIO ROBERTO

1. APÓS UMA NOITE INFINITA

Nas noites claras faz-se o amor sem fim,

Quanto guardado, nunca saberemos,

Em leitos navegando seus extremos,

E consumindo-se a si mesmo assim...

Não se detém em ti, não cabe em mim

A chama em que no gozo ascendemos,

Restante nos segundos que não temos

Roubado ao tempo, em recomeço, enfim,

Desvelando em escândalos secretos

Os atos delicados e concretos

Da mais amada flor umedecida,

Esse amor não se almeja satisfeito

E vive de incertezas, mas refeito,

A plenitude quer-se inatingida...

2. NOTURNO

Apressada caminha para casa

Numa rua talvez adormecida,

Fico a vê-la da esquina proibida

Na noite que essa madrugada abrasa...

Seu corpo amado nosso amor envasa

― impossibilidade acontecida,

Cada chegada faz-se despedida

Quando a paixão agita nua asa.

A brisa povoada de incerteza

Faz recordar lençóis abandonados

Onde a fúria de amar esteve presa...

Revejo-a em sons, desejo e nostalgia,

E temo esses adeuses adiados

Do mais definitivo adeus um dia...

3. SONETO DE VÉSPERA

Nem mesmo teu estado interessante

Frustrava o rubro amor do meio-dia,

Que no tempo tirano se imprimia

No lençol que continha aquele instante...

Minha bela, era eterno esse durante

Em face da partida que se via

Avizinhar-se, e louco te queria

como perfeita e delicada amante...

Como restar sem mais aquelas horas

Que a vida resumiu em nossa chama?

Outro desejo ardente te reclama

Perdido na distância em que demoras...

Só dessas fugas viverei mais tarde,

Enquanto nosso amor por ti aguarde...

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Gomes da Silveira
Enviado por Gomes da Silveira em 05/07/2010
Reeditado em 05/07/2010
Código do texto: T2359307
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