PROMESSAS DE AMOR
Nietzsche em um aforismo debocha da promessa de amor. E é verdade isso. Como podemos fazer promessas de manter um sentimento em um tempo futuro? Ainda mais em um sentimento cuja volubilidade é cantada em verso e prosa, como, por exemplo, vemos em “Carmem”. O amor é um pássaro livre e nada se pode fazer se ele não quiser pousar.
A resposta talvez possa ser buscada na seara jurídica, mais especificamente naquela parte que trata dos contratos. Em geral os contratos são regidos por uma antiga parêmia, vinda do direito romano, expressa na fórmula “pacta sunt servanda”, ou “os acordos devem ser observados”. Desta maneira, se estabelece sanções para aquele contratante que não honrar o compromisso firmado.
Entretanto, os juristas verificaram a possibilidade da ocorrência de situações futuras que tornem esta obrigatoriedade extremamente injusta em decorrência de fatos os quais não se poderia esperar que ocorressem no momento em que é firmado o acordo. Daí formularam a chamada “Teoria da imprevisão”, cuja fórmula central é o dito “rebus sic stantibus”, ou “enquanto as coisas estão assim”.
Desta maneira, a rígida obrigatoriedade de cumprimento dos acordos é atenuada pela observação de que esta obrigatoriedade só pode ser exigida caso não haja mudança significativa nas condições em que o pacto foi firmado. Assim, por exemplo, se foi prometida a entrega de uma ponte mediante o pagamento uma determinada soma, pode-se alterar para mais o pagamento desde valor em caso da descoberta de condições imprevisíveis que tornem extrema e injustamente oneroso o estrito cumprimento do que foi firmado originalmente.
Voltemos agora ao terreno pantanoso do amor. Quando nos apaixonamos, em geral, estamos muito jovens, a perspectiva em que vemos a vida é limitada e, principalmente, pensamos que o sentimento amoroso é absoluto. E o que vemos com freqüência? Seis meses ou um ano depois os dois pombinhos se separam cada qual com tanto asco um do outro que parecem nunca terem dito as belas juras cravadas em ouro e filmadas a cores e com som estéreo.
E podemos dizer que as juras eram mentirosas? Acho que não. Desde que as condições firmadas permanecessem as mesmas, provavelmente viveriam eternamente como esposo e esposa. Entretanto, no dia a dia virão inúmeras descobertas as quais antes estavam encobertas pela bajulações, pelos rapapés e pelas mesuras com as quais nos apresentamos quando estamos querendo seduzir alguém.
Em geral, os segundos e mesmo terceiros casamentos tendem a ser mais felizes e prolongados do que o primeiro. Não apenas por causa da maturidade dos nubentes, mas também porque aprendem a ser mais tolerantes e, principalmente, sabem quais as qualidades são mais importantes em um bom parceiro. Aí se vê, por exemplo, que a beleza física vale muito menos que o bom caráter e a higiene.
Na verdade, a ilusão do “pacta sunt servanda” do amor erótico e complementada depois pelo “rebus sic stantibus” do amor maduro, que é parente próximo da amizade. E a amizade é um sentimento amoroso muito mais perene e nobre que aquele põe fogo em jovens amantes. Somente quem possui uma admiração sincera pela personalidade do outro pode prometer estar sempre ao seu lado, venha o que vier. E a união vai durar para sempre pelos caminhos da amizade. Alguns poucos casais jovens têm a felicidade de descobrir este fato ainda cedo.