Beyoncè e Ivette Sangalo na Estrebaria
Por: Valdeck Almeida de Jesus
Foto: Divulgação
Esta foi a segunda vez que fui ao Parque de Exposições de Salvador para ver um show. A primeira, em 1993, foi para ver o Arraiá da Capitá, uma espécie de festa junina em miniatura que acontecia naquele espaço. O São João é uma festa típica do interior e eu, recém chegado à capital da Bahia, ainda estava muito ligado aos festejos juninos. Convidado por alguns poucos amigos que arrebanhei nas andanças pelos ensaios abertos de bandas de pagode que hoje cobram os olhos da cada por um ingresso, me arrumei todo e fui matar a saudade do forró, milho assado, canjica e outras iguarias consumidas especialmente no mês de junho.
A primeira impressão foi de espanto, pelo grande espaço onde a festa foi montada. Pensava eu que seria uma ‘arraialzinho’ com barraquinhas de comidas e bebidas, mas era um mundo a céu aberto, onde milhares de pessoas dançavam, comiam, namoravam e se divertiam pra valer. A decepção veio logo em seguida: a poeira levantada pelo ‘arrasta-pé’ da multidão me sufocou. Comecei a passar mal e tive que sair às pressas do ambiente para evitar uma crise profunda de alergia.
Como a festa continuava e meus amigos não desanimavam por nada, fiquei indo e voltando para dentro e para fora do parque, até alta madrugada. Quando a festança chegou ao fim, fomos todos para o final de linha do bairro Mussurunga 1 esperar o pernoitão, ônibus que roda a cidade inteira, da meia noite às cinco da manhã. Cochilávamos todos sentados no meio-fio, com medo de ser assaltados e com medo de perder o próximo ônibus. Não sei o que nos amedrontava mais. Finalmente, todos embarcaram e eu dei adeus àquele espaço para sempre. Quer dizer, quase.
Digo quase pois, em 2010, passados mais de dezessete anos, retornei ao parque, para assistir a um mega show. No final de 2009 a internet e toda a mídia da Bahia anunciavam o grande evento da década: Beyoncè viria a Salvador a convite de Ivette Sangalo. Alguns sites mentiam, outros desmentiam, eram comentários contra e a favor. Enfim, os sites oficiais começaram a divulgar datas e horários dos shows: primeiro, em Florianópolis, depois Rio e São Paulo e, finalmente, Salvador. Comecei a acreditar pois, em caso de shows internacionais, o sul e sudeste sempre ‘patrocinam’ a vinda das mega estrelas. Uma vez em território nacional, não seria sacrifício algum pegar um voo direto para a capital baiana. E, ainda mais, patrocinado ou patrocinada por Ivette Sangalo, uma das únicas pessoas que sabem empresariar no norte e nordeste, nenhuma mega, ultra, super, hiper estrela mundial seria louca de recusar um passeio pela “Terra da Felicidade” (de alguns).
Ingressos comprados pela internet, recebi o par de entradas no conforto do meu lar. Deus me livre de enfrentar a selvageria dos fãs invadindo um grande shopping da cidade para chegar na frente e garantir a compra dos primeiros lugares.
Meses de ansiedade, medo de que Beyoncè cancelasse ou adiasse a vinda. Finalmente o grande dia: 10 de fevereiro de 2010, quarta-feira, dia de aula na minha faculdade, onde frequento o curso de jornalismo. Eu teria que faltar à aula, por uma boa causa. E faltei. Beyoncè e Ivette mereciam. Elas não poderiam fazer o show sem minha presença na plateia (risos).
Eu moro a cerca de 20 quilômetros do Parque de Exposições de Salvador. A principal via de ligação é a Avenida Paralela, mas antes eu teria que pegar a Avenida Bonocô, ambas um inferno de engarrafamento em dias de semana. Como o show começaria às 20 horas, eu teria que sair de casa às seis da tarde para tentar chegar no horário, pois a partir das quatro da tarde as duas vias de acesso praticamente param de tanto carro. Tentei escapar do trânsito intenso indo em direção à Cidade Baixa, seguindo pela Avenida Suburbana, pegando um atalho pelo bairro Lobato, alcançando a BR-324, seguindo em direção a Feira de Santana, entrando no Centro Industrial de Aratu e Rodovia CIA-Aeroporto para, finalmente, chegar ao final da Avenida Paralela, exatamente onde o parque se encontra instalado. Estacionei o carro atrás da Estação Mussurunga de Ônibus e segui uns quinhentos metros caminhando pela passarela que atravessa a avenida até a entrada do parque. Empolgado e ansioso, não prestei muita atenção às instalações. Corri feito boi na manada, de um lado para outro, tentando encontrar a entrada para o Camarote VIP, em frente ao palco principal. Instalado, não arredei pé da mureta para não perder meu lugar. Ali permaneci por mais de seis horas, durante os dois shows.
A maravilhosa Ivette Sangalo, sangue quente, “arretada”, verdadeira, uma anfitriã completa. No horário previsto entrou no palco, saudou o público e brindou a todos com músicas atuais e antigas, fazendo uma retrospectiva para homenagear os 60 anos do trio-elétrico (leia-se Armadinho, Dodô e Osmar – o verdadeiro “trio”, nome que batizou, depois, o caminhão onde os artistas se apresentam): Rebolation, Dancing Days, “Preta, fala pra mim…”, sons de charanga de escola, “Oh, Maluquete, diga de quem você é tiete… eu sou, show tiete do Chiclete…”, “Chupa toda” e outros embalos, além de “Dalila… vai, buscar Dalilaaaaaa…” fizeram a plateia enlouquecer.
Ivette brinca com seus fãs, diz que tem uma marca de “PEREBA” na perna, joga água mineral para o povo, reclama dos ventiladores do palco, toca atabaque, dança lambada, põe Xuxa para falar ao microfone e a saúda com o “Ilariêeee”, brinca com a declaração de Léo, do Parangolé, que disse estar “ficando” com Perla, quando flagrado num beijo escandaloso com a cantora… Ivette diz no show “se aquilo é ‘ficar’, eu não sei o que é sexo…”. Em seguida, a cantora cantou o novo sucesso “Vou te comer”, ilustrada com imagens do Lobo Mau e da Capeuzinho Vermelho em desenho no telão ao fundo do palco… A plateia delirou, literalmente…
Antes de abandonar o palco e não voltar mais, dando lugar à “Perla brasileira” ou “Prima de Dalila” (Alcunhas de Beyoncè, segundo Sangalo), Ivette agradeceu ao público e disse que o sucesso de mais de quinze anos se deve à sua personalidade forte e ao apoio de baianos e brasileiros. Ela disse, ainda, que cada fã deve se sentir um pouco a Ivette, que não é uma personagem e sim uma pessoa real, que é a mesma em casa, no trio ou no palco. “Eu não conseguiria sustentar um “papel de teatro” durante tanto tempo. Sou muito verdadeira”. Em seguida, brincando, mais uma vez, disse que Beyoncè gostou tanto de Salvador que iria comprar uma casinha no subúrbio de Periperi para morar.
Na vez da Diva americana se apresentar, só mesmo para quem assistiu para poder dizer o que sentiu… Eu fiquei extasiado, gritava feito louco, pulava como um descontrolado e vibrava a cada acorde, a cada grito estridente da estrela. Filmei quase todo o espetáculo e tirei centenas de fotos. As oito pilhas sobressalentes não foram suficientes para aguentar até o final do show…
Quando acabou, fiquei anestesiado e triste. Quando verei novamente uma apresentação tão linda?
O terror começou na saída: os portões ainda estavam com os “currais” que obrigavam a multidão a se comprimir e se espremer para passar por entre grades… O chão de terra levantava uma poeira que sucofava e me fez lembrar da sensação horrível que tive na primeira visita à estrebaria e à pocilga que é o Parque de Exposições de Salvador. Ali é um espaço apropriado para expor gado, cavalo, cabra e avestruz e não um local próprio para shows nacionais, muito menos para shows do quilate do de Beyoncè.
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VALDECK ALMEIDA DE JESUS, 43, Jornalista, funcionário público, editor de livros e palestrante. Membro correspondente da Academia de Letras de Jequié e efetivo da União Brasileira de Escritores. Embaixador Universal da Paz. Publicou os livros Memorial do Inferno: a saga da família Almeida no Jardim do Éden, Feitiço contra o feiticeiro, Valdeck é Prosa e Vanise é Poesia, 30 Anos de Poesia, Heartache Poems, dentre outros, e participa de mais de 60 antologias. Organiza e patrocina o Prêmio Literário Valdeck Almeida de Jesus de Poesia, desde 2005, o qual já lançou mais de 600 poetas. Site: www.galinhapulando.com e E-mail: valdeck2007@gmail.com
Por: Valdeck Almeida de Jesus
Foto: Divulgação
Esta foi a segunda vez que fui ao Parque de Exposições de Salvador para ver um show. A primeira, em 1993, foi para ver o Arraiá da Capitá, uma espécie de festa junina em miniatura que acontecia naquele espaço. O São João é uma festa típica do interior e eu, recém chegado à capital da Bahia, ainda estava muito ligado aos festejos juninos. Convidado por alguns poucos amigos que arrebanhei nas andanças pelos ensaios abertos de bandas de pagode que hoje cobram os olhos da cada por um ingresso, me arrumei todo e fui matar a saudade do forró, milho assado, canjica e outras iguarias consumidas especialmente no mês de junho.
A primeira impressão foi de espanto, pelo grande espaço onde a festa foi montada. Pensava eu que seria uma ‘arraialzinho’ com barraquinhas de comidas e bebidas, mas era um mundo a céu aberto, onde milhares de pessoas dançavam, comiam, namoravam e se divertiam pra valer. A decepção veio logo em seguida: a poeira levantada pelo ‘arrasta-pé’ da multidão me sufocou. Comecei a passar mal e tive que sair às pressas do ambiente para evitar uma crise profunda de alergia.
Como a festa continuava e meus amigos não desanimavam por nada, fiquei indo e voltando para dentro e para fora do parque, até alta madrugada. Quando a festança chegou ao fim, fomos todos para o final de linha do bairro Mussurunga 1 esperar o pernoitão, ônibus que roda a cidade inteira, da meia noite às cinco da manhã. Cochilávamos todos sentados no meio-fio, com medo de ser assaltados e com medo de perder o próximo ônibus. Não sei o que nos amedrontava mais. Finalmente, todos embarcaram e eu dei adeus àquele espaço para sempre. Quer dizer, quase.
Digo quase pois, em 2010, passados mais de dezessete anos, retornei ao parque, para assistir a um mega show. No final de 2009 a internet e toda a mídia da Bahia anunciavam o grande evento da década: Beyoncè viria a Salvador a convite de Ivette Sangalo. Alguns sites mentiam, outros desmentiam, eram comentários contra e a favor. Enfim, os sites oficiais começaram a divulgar datas e horários dos shows: primeiro, em Florianópolis, depois Rio e São Paulo e, finalmente, Salvador. Comecei a acreditar pois, em caso de shows internacionais, o sul e sudeste sempre ‘patrocinam’ a vinda das mega estrelas. Uma vez em território nacional, não seria sacrifício algum pegar um voo direto para a capital baiana. E, ainda mais, patrocinado ou patrocinada por Ivette Sangalo, uma das únicas pessoas que sabem empresariar no norte e nordeste, nenhuma mega, ultra, super, hiper estrela mundial seria louca de recusar um passeio pela “Terra da Felicidade” (de alguns).
Ingressos comprados pela internet, recebi o par de entradas no conforto do meu lar. Deus me livre de enfrentar a selvageria dos fãs invadindo um grande shopping da cidade para chegar na frente e garantir a compra dos primeiros lugares.
Meses de ansiedade, medo de que Beyoncè cancelasse ou adiasse a vinda. Finalmente o grande dia: 10 de fevereiro de 2010, quarta-feira, dia de aula na minha faculdade, onde frequento o curso de jornalismo. Eu teria que faltar à aula, por uma boa causa. E faltei. Beyoncè e Ivette mereciam. Elas não poderiam fazer o show sem minha presença na plateia (risos).
Eu moro a cerca de 20 quilômetros do Parque de Exposições de Salvador. A principal via de ligação é a Avenida Paralela, mas antes eu teria que pegar a Avenida Bonocô, ambas um inferno de engarrafamento em dias de semana. Como o show começaria às 20 horas, eu teria que sair de casa às seis da tarde para tentar chegar no horário, pois a partir das quatro da tarde as duas vias de acesso praticamente param de tanto carro. Tentei escapar do trânsito intenso indo em direção à Cidade Baixa, seguindo pela Avenida Suburbana, pegando um atalho pelo bairro Lobato, alcançando a BR-324, seguindo em direção a Feira de Santana, entrando no Centro Industrial de Aratu e Rodovia CIA-Aeroporto para, finalmente, chegar ao final da Avenida Paralela, exatamente onde o parque se encontra instalado. Estacionei o carro atrás da Estação Mussurunga de Ônibus e segui uns quinhentos metros caminhando pela passarela que atravessa a avenida até a entrada do parque. Empolgado e ansioso, não prestei muita atenção às instalações. Corri feito boi na manada, de um lado para outro, tentando encontrar a entrada para o Camarote VIP, em frente ao palco principal. Instalado, não arredei pé da mureta para não perder meu lugar. Ali permaneci por mais de seis horas, durante os dois shows.
A maravilhosa Ivette Sangalo, sangue quente, “arretada”, verdadeira, uma anfitriã completa. No horário previsto entrou no palco, saudou o público e brindou a todos com músicas atuais e antigas, fazendo uma retrospectiva para homenagear os 60 anos do trio-elétrico (leia-se Armadinho, Dodô e Osmar – o verdadeiro “trio”, nome que batizou, depois, o caminhão onde os artistas se apresentam): Rebolation, Dancing Days, “Preta, fala pra mim…”, sons de charanga de escola, “Oh, Maluquete, diga de quem você é tiete… eu sou, show tiete do Chiclete…”, “Chupa toda” e outros embalos, além de “Dalila… vai, buscar Dalilaaaaaa…” fizeram a plateia enlouquecer.
Ivette brinca com seus fãs, diz que tem uma marca de “PEREBA” na perna, joga água mineral para o povo, reclama dos ventiladores do palco, toca atabaque, dança lambada, põe Xuxa para falar ao microfone e a saúda com o “Ilariêeee”, brinca com a declaração de Léo, do Parangolé, que disse estar “ficando” com Perla, quando flagrado num beijo escandaloso com a cantora… Ivette diz no show “se aquilo é ‘ficar’, eu não sei o que é sexo…”. Em seguida, a cantora cantou o novo sucesso “Vou te comer”, ilustrada com imagens do Lobo Mau e da Capeuzinho Vermelho em desenho no telão ao fundo do palco… A plateia delirou, literalmente…
Antes de abandonar o palco e não voltar mais, dando lugar à “Perla brasileira” ou “Prima de Dalila” (Alcunhas de Beyoncè, segundo Sangalo), Ivette agradeceu ao público e disse que o sucesso de mais de quinze anos se deve à sua personalidade forte e ao apoio de baianos e brasileiros. Ela disse, ainda, que cada fã deve se sentir um pouco a Ivette, que não é uma personagem e sim uma pessoa real, que é a mesma em casa, no trio ou no palco. “Eu não conseguiria sustentar um “papel de teatro” durante tanto tempo. Sou muito verdadeira”. Em seguida, brincando, mais uma vez, disse que Beyoncè gostou tanto de Salvador que iria comprar uma casinha no subúrbio de Periperi para morar.
Na vez da Diva americana se apresentar, só mesmo para quem assistiu para poder dizer o que sentiu… Eu fiquei extasiado, gritava feito louco, pulava como um descontrolado e vibrava a cada acorde, a cada grito estridente da estrela. Filmei quase todo o espetáculo e tirei centenas de fotos. As oito pilhas sobressalentes não foram suficientes para aguentar até o final do show…
Quando acabou, fiquei anestesiado e triste. Quando verei novamente uma apresentação tão linda?
O terror começou na saída: os portões ainda estavam com os “currais” que obrigavam a multidão a se comprimir e se espremer para passar por entre grades… O chão de terra levantava uma poeira que sucofava e me fez lembrar da sensação horrível que tive na primeira visita à estrebaria e à pocilga que é o Parque de Exposições de Salvador. Ali é um espaço apropriado para expor gado, cavalo, cabra e avestruz e não um local próprio para shows nacionais, muito menos para shows do quilate do de Beyoncè.
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VALDECK ALMEIDA DE JESUS, 43, Jornalista, funcionário público, editor de livros e palestrante. Membro correspondente da Academia de Letras de Jequié e efetivo da União Brasileira de Escritores. Embaixador Universal da Paz. Publicou os livros Memorial do Inferno: a saga da família Almeida no Jardim do Éden, Feitiço contra o feiticeiro, Valdeck é Prosa e Vanise é Poesia, 30 Anos de Poesia, Heartache Poems, dentre outros, e participa de mais de 60 antologias. Organiza e patrocina o Prêmio Literário Valdeck Almeida de Jesus de Poesia, desde 2005, o qual já lançou mais de 600 poetas. Site: www.galinhapulando.com e E-mail: valdeck2007@gmail.com