Porque o casamento hoje é desnecessário - pesquisa histórica

Sábado agora Grilo vai se casar. Grilo é o Luíz fernando, irmão de Paulo Mendonça, filho do sr. luís e da Dona Valéria. Coisa de mineiro. Vocês ouviram. Eu não acreditei, ninguém acredita ainda. Mas ele vai. Já comprou casa e tudo. Então lá vou eu tirar minha gravata do fundo falso da gaveta.

MAs estive pensando...

... era um evento tamanho a sagração nupcial...' Li isso sobre um casamento num livro. E, de repente, me vi pensando em um monte de coisas. Qual o sentido do casamento nos dias de hoje? E do noivado? O que estas coisas significam, ou seja, de que elas tomam o lugar, qual o seu signo? Porque, nos tempos d'antanho (estou gastando o arcaico hoje), como nos diz a música de Chico e Edu Lobo (Opereta do casamento), o casamento consistia numa autorização social para que o casal pudesse fazer sexo. Até aí tudo bem. Meio radical demais, mas inteligível. E "ai" de quem não esperasse tal autorizacão. 'Quero muito casar com você' significava, na verdade, 'Preciso fazer sexo com você urgentemente...' Em alguns lugares, chegava-se ao ridículo de expor publicamente o lençol das núpcias, sujo do sangue que comprovava a defloração da moça. Continuemos com a música: 'Do pudor da noiva a bandeira, após a noite primeira, desfraldava-se ao sol, a sua virtudeescarlate, igual brasão de tomate, enobrecendo o lençol. Mas se não houvesse tal mancha, que outramancha mais ancha se ocultava por trás... E o rapaz pagava o malogro, com a vendeta do sogro, oucom a malícia dos mortais'.

Mas a primeira função do casamento, na verdade uma 'troca de mulheres' remonta ao III milênio a.C. (e viva o wikipedia), com o surgimento da guerra. Vocês leram certinho: GUERRA. A guerra é resultado do abandono da vida nômade pelos seres humanos, do surgimento da agricultura, e da conseqüente falta de terra fértil para todos, as mulheres e filhos.

Os homens partem para a guerra, e a troca de mulheres entre as tribos acaba se tornando uma maneira de pacificar inimigos, e conseguir aliados (Eu lhe dou aquela loira peituda em troca daquele terreninho perto da montanha se você prometer deixar minhas cercas de pé. e ainda lhe volto duas camponesas gordas..).

As relações sexuais passam a se realizar fora da comunidade de origem, e passa a haver uma espécie de contrato entre as partes. Na verdade, um contrato entre os homens que 'fazem negócio' com a mulher em questão (pois, nesta época, os homens já dominavam o mundo, Antes na prática, hoje na teoria) justamente em função de sua participação na guerra. As exigências de virgindade e fidelidade da mulher, que surgem nos períodos seguintes da história humana, estão relacionadas à necessidade de garantia de que as posses excedentes do homem serão herdadas pelos seus filhos legítimos. Já no século XVIII, surge o infeliz cujo nome não me recordo que criou o tal ideal de 'amor romântico', [que] parece ser uma invenção masculina estratégica para criar na mulher o desejo do casamento. Eu disse isso em voz alta? Disse. Já que disse, acrescento ainda que a mulher (historicamente) sempre serviu ao homem: Primeiramente, com a função de conseguir aliados e de elevar sua posição social através da 'troca' das mulheres, depois, com a função de garantir, minimamente, a transmissão de sua herança para sua descendência. Para a mulher, o casamento sempre representou uma espécie de escravidão: Ser mandada para longe da família, para garantir a paz entre os homens, ou ser a 'mãe dos filhos de alguém', devendo a este alguém não só fidelidade e obediência, mas também a facilitação da vida pública, ao realizar as tarefas menos valorizadas socialmente – e após a Revolução Industrial, tratando de manter-se fora do mercado de trabalho, para não competir com os homens pelas vagas disponíveis. Que rapidamente seja disseminada a idéia de que o casamento é um desejo da mulher, e que esta seja vista como a que quer 'prender', 'amarrar', 'laçar' o homem, e que a fêmea humana torne-se uma das poucas – se não a única – que 'necessita' ter uma aparência mais chamativa que a do macho.

Durante muitíssimo tempo o casamento teve uma função sócio política que nada tinha a ver com o amor. A partir do momento em que as mulheres conquistam a independência financeira e passaram a pagar os próprios milk shakes, e com o surgimento dos mais diversos tipos de contraceptivos, perde-se a noção destes motivos iniciais para o casamento e, embora ele continue a representar um contrato, trata-se de um contrato um tanto ou quanto diferente. Se, por um lado, é um contrato que define o que faz parte do meu, do seu, ou do nosso patrimônio, ele também passa a significar um contrato que obrigaria o homem à fidelidade. Por isso ele se sente 'amarrado', etc. Já a mulher está obrigada à fidelidade desde sempre. Muitas, ainda hoje, pagam com a morte qualquer transgressão. Mas se, hoje, além do sexo acontecer quase que cem por cento das vezes antes do casamento nas sociedades ocidentais (evoluímos!), a mulher já exige do homem esta fidelidade também muito tempo antes de casar.

Então para que PORRA serve um casamento?

Parece ter relação com o desejo de ter filhos, e com a fantasia de que o amor irá durar para sempre. Então a tal fidelidade, exigida de ambas as partes, deverá ser para sempre também.

Tanto é que um dos ritos trata-se da fatídica 'despedida de solteiro', onde o noivo transa com pelo menos uma profissional do sexo (pode ser a prima também. geralmente dá no mesmo e relembra tempos mais simples), como forma de despedir-se da possibilidade de transar com outra pessoa que não a futura esposa. Mas, como eu disse acima, hoje em dia a fidelidade já é exigida há muito tempo (se cumprida ou não, aí são outros quinhentos...). Então as tais festinhas dificilmente acontecem. Por que antes a fidelidade só era exigida do homem depois do casamento (e as despedidas de solteiro tinham um certo sentido)? Muito simples: As mulheres não faziam sexo antes do casamento (mesmo que a abstinência sexual lhes fosse impingida, as mulheres acabavam por personificar a negação do sexo), e por isso não poderiam exigir que o namorado ou noivo ficasse sem sexo também (as mulheres perderam a compaixão ao longo da história). Porque os homens não agüentam, sabe? Eles podem ter algum tipo de ataque se ficarem sem sexo. Brincadeiras à parte, os homens não tinham real motivo para evitar o sexo antes do casamento, a não ser o ciúme da namorada. E, normalmente, nesta época, as únicas mulheres disponíveis para sexo fora do casamento eram as profissionais do sexo (chamadas de nomes menos bonitos nestes tempos em que não éramos obrigados a ser politicamente corretos).

Hoje, no Brasil, mesmo que você não queira casar, nosso Código Civil está tão ridículo, que corre o risco de você ter que dividir seu apartamento com a pessoa com quem namorou dez dias. Ou seja, foram criados mecanismos de controle, que definem o que é uma 'relação estável' e que obrigam a certas responsabilizações financeiras. Se quiser fugir disso, o casal precisa fazer um contrato em cartório, para garantir a separação total de bens. Ou seja: hoje em dia é preciso um contrato para não casar. Separar-se está quase tão difícil para quem é casado quanto para quem não é. Quanto aos filhos, há muito tempo que eles devem ser reconhecidos por ambos os genitores, independente do estado civil de ambos e de cada um. E o exame de DNA não deixa mais dúvida sobre dúvida.

Durante algum tempo, as pessoas usaram alianças finíssimas, ou aliança nenhuma, apesar de serem casadas diante de Deus e dos homens. Hoje, isso acabou. Como o casamento é realmente opção, as pessoas estão colocando verdadeiras argolas nos dedos, quase da grossura de uma lata de refrigerante.

E o noivado? Ah, o noivado! Durante alguns anos (possivelmente décadas de 60 e 70), significava uma liberação adiantada para o sexo entre o casal. As mulheres não casavam mais virgens, mas o marido era o primeiro (e único) homem da vida delas (até que o desquite ou a infidelidade os separasse). Depois, virou apenas um aviso de que, um dia, o casamento iria sair. E aí pessoas começaram a morar juntas, mas, para avisar ao pais (e às vezes ao resto da sociedade) que não pretendiam deixar de casar, passaram a dizer-se noivas, às vezes, com festa de noivado e tudo. A quantidade de pessoas noivas que eu conheço ou conheci, vivendo, contudo, maritalmente... Muitas vezes, o casamento destes noivos vem depois de uma gravidez indesejada (será que pela mulher também? ops. isso foi maldoso).

Enfim, tirante o desejo de ficar junto, de dormir na mesma cama todo dia, de ter filhos, tudo isso perfeitamente possível de ser feito com a maior simplicidade e facilidade para a maioria esmagadora das pessoas com mais de 18 anos, parece existir ainda uma necessidade de realizar esta cerimônia e assinar este contrato. E a noiva continua casando de branco, símbolo da virgindade e da pureza, e linda como uma princesa. Claro, há quem dê importância apenas ao lado religioso do casamento. Outros, cínicos, dirão que as pessoas casam apenas para ganhar presentes. Quer saber? A festa dar tanto trabalho, e custar tão caro, que não deve ser isso não. Penso mais que é uma espécie de anúncio de posse (de ambos os lados), e a necessidade de receber um aval social. O casal, depois disso, torna-se 'respeitável'.

Enfim (de novo), ainda precisamos (ou muitos precisam) de licença para fazer sexo. Que seja ao menos dos bons. E como diria o desbocadíssimo Vinícius de Moraes, parodiando a si mesmo: 'Que não seja imortal posto que é chama, mas que seja infinito enquanto duro'...

Felipe Lacerda
Enviado por Felipe Lacerda em 15/01/2010
Código do texto: T2030945
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