O teorema da anti-democracia
Só existe uma conta em que a minoria vence: a eleitoral
Em nossa democracia, nem a matemática é exata. O critério pelo qual são eleitos vereadores e deputados no Brasil, simplesmente “consome” 60% dos votos e reconduz ao poder, com freqüência, nomes inacreditáveis. No título desse artigo a palavra “Teorema” antecede com justiça o termo “anti-democracia”. Tanto quando significa “afirmação que pode ser provada”, como quando quer dizer “espetáculo”, em sua origem grega.
Para quem não conhece a conta, tomemos como exemplo um pleito municipal. Vamos imaginar que uma eleição teve 10 mil votos válidos para vereador e que haja 10 cadeiras na Câmara Municipal. O número de votos válidos é dividido pela quantidade de cadeiras. Logo, temos mil (1000) votos por vaga, o chamado quociente eleitoral. Nesse caso, um partido que tenha feito dois mil votos elege dois vereadores, ou seja, os dois mais votados do partido.
Como os números quase nunca são exatos (como no exemplo) acabam sobrando votos e cadeiras. O processo seguinte, conhecido como rebuscagem, distribui as vagas restantes entre as sobras de votos dos partidos que tenham alcançado o quociente eleitoral. Seguindo a hipótese já citada, um partido com 999 votos não alcança o quociente, logo, mesmo que esses votos tenham sido feitos por um só candidato, eles nada valem nessa conta.
Considerando que poucas vezes na História, um candidato alcançou sozinho o quociente eleitoral (os 1000 votos ou mais) o que temos aqui é um grande engano. Por quê? A soma dos votos dos eleitos raramente chega a 40% do total. A equação eleitoral está de ponta-cabeça. Um espetáculo que nos põe bobos... da corte. Nos meus parcos conhecimentos da Matemática, jamais vi conta como esta; na qual “menos” tem peso maior.
Na última eleição para o cargo de vereador da cidade de São Paulo foram considerados válidos, 6.005.928 votos. Desse total, 2.169.289 pessoas votaram em um dos 55 vereadores paulistanos. Ao pé da letra, os votos de mais 3,8 milhões de cidadãos restantes não foram considerados. Se parece irreal leve em consideração que o mais votado entre os vereadores eleitos de São Paulo, recebeu 102.048 votos.
Caros eleitores, a quem interessa essa conta? Calcule que os 3,8 milhões de votos – que a equação descartou – são pelo menos 37 vezes mais que a votação recebida pelo melhor colocado do processo eleitoral. O quadro geral fica assim: 44 vereadores não chegaram a 50 mil votos cada. O percentual individual desses é inferior a 1% do total de eleitores de São Paulo. O que significa que nesta conta não há democracia; isso sem considerar o fator rebuscagem.
Junte a isso, o fato de que muitos candidatos (os candidatos !!!) a vereador desconhecem essa equação. Gente que passa a vida à disposição dos partidos e que, por melhores propostas que apresente, dificilmente ocupará uma cadeira no parlamento. De posse de pesquisas, fica muito barato a quem conhece o vil sistema se eleger pela compra de votos.
Não afirmo que isso tenha acontecido em São Paulo, nesta última eleição, mas quem pode negar que o sistema é pernicioso a todo o país e em qualquer tempo? Tanto o é, que uma multidão desiludida “acende velas” à ditadura e por ora se conforma em votar em branco ou nulo, confirmando quem já não serve.
Numa opinião pessoal, para esse sistema ser legítimo – e até mais interessante que o voto distrital, por exemplo – seria interessante que os eleitos tivessem que apresentar projetos, indicações e requerimentos de autoria de seus companheiros de partido. Afinal, sem eles não sentariam nas confortáveis cadeiras do Legislativo, critério que dá sentido à Lei de fidelidade partidária. Aliás, bom seria que as decisões de cada parlamentar fossem tomadas com o voto dos demais candidatos do seu partido, pelo menos na esfera municipal.
Mas tudo isso, toda essa argumentação, se nos toma algum tempo, também nos diz que este meus amigos, é o "calcanhar de Aquiles" da anti-democracia!