O indivíduo frente à ética nacional
O que é ética? Esta é a pergunta que deve ser respondida antes de mais nada. Vemos as pessoas reagirem indignadas frente ao festival de corrupção que assola dia e noite os nossos noticiários. Estas pessoas, por fim, costumam se dizer “desiludidas da política”, pregam coisas como “voto em branco”, e outras tolices que não servem para nada, exceto passar ao largo de uma reflexão sobre o tema.
Ética vem de ethos, que no seu sentido originário tinha um significado semelhante a “costume”. Assim, na verdade, a ética se refere a um modo de agir que em sociedade se considera correto. Quando Raul Seixas cantava que “quem quer viver num buraco de rato, de rato você tem que transar”, dizia isto. Uma forma de agir em determinado lugar pode não ser bem aceita em outro.
O padrão de comportamento varia de acordo com o grupo social. Isto também significa que a ética é variável, mas todos possuem uma. Mesmo entre ladrões há uma ética, que se for quebrada pode levar a grupo a adotar sanções contra seu violador. Se você quiser adotar uma postura de caridade cristã dentro deste grupo, com certeza terá sérios problemas. Da mesma maneira existem maneiras de agir que são ou não são aceitáveis dependendo de se você é um empresário, um trabalhador, um silvícola, etc.
Voltemos agora à política e àquele cidadão indignado com a falta de ética de seus representantes nas câmaras legislativas. É ele quem os elege. Então, de certa forma, este indivíduo escolhe quem melhor espelha sua personalidade. Não é possível que, sendo as pessoas que adotam comportamento antiético a minoria na sociedade, fossem justamente estas as escolhidas pelo povo. Então estou dizendo que a corrupção dentro da casa do povo reflete o modo de agir do indivíduo médio em seu dia-a-dia? obviamente.
O brasileiro se orgulha de ser corrupto. Ainda se louva o famoso “jeitinho brasileiro” com o qual resolvemos tudo. Foi pego em uma infração de transito? Ah, é só oferecer um pra “cervejinha” do seu guarda que tudo está resolvido. A conta de energia elétrica está muto alta? Em vez de pôr em prática medidas para redução do consumo, vamos instalar um “gato” e tudo ficará “beleza”. Existem países em que as pessoas teriam vergonha de realizar tais “façanhas”, mas aqui o feito é contado com orgulho em mesas de boteco, entre um e outro gole de cerveja.
Então, este indivíduo médio, quando vai escolher outro para votar as leis que irão reger a todos, escolhe um dos seus iguais. E este fará exatamente o que o indivíduo médio faria. Vai agir de maneira fisiológica. Da mesma maneira que um frauda o imposto de renda, o outro vai botar dinheiro nas meias, na cueca e onde mais couber a propina, que é o que, na ausência de ideais, move tanto o cidadão ordinário, quanto o “Vossa Excelência”, agora aboletado no poder.
Existem muitas explicações sobre o porquê do brasileiro agir desta maneira. Muitas raízes históricas são buscadas e, em geral, se culpa nossa forma de colonização e a influência católica pela safadeza geral. O fato é que desde o início de nossos tempos já se contava com a “amizade” para os “quebra-galhos” necessários para um bem viver, documentadas até mesmo na famosa carta de Pero Vaza de Caminha.
“Você é meu amigo e boi não lambe”. Reforçada na política da Casa Grande e da Senzala, este mote se perpetuou e ainda impera dentro da sociedade brasileira. Vota-se no “amigo”, e não naquele que tem um melhor projeto e história de vida. Vejam como os políticos corruptos são simpáticos! É por isto que o povo sempre os reconduz aos mais altos cargos da República. Collor voltou ao senado. José Arruda se tornou governador. E por aí vai.
Não que eu ache que isto seja irremediável e imutável. Pelo contrário, acho que os comportamentos são históricos e tendem a sofrer mutações com o passar do tempo. Somos ainda uma democracia ainda jovem. Mudanças já devem estar ocorrendo, ainda que sejam imperceptíveis. Mas estas mudanças devem começar pelo indivíduo que protesta contra a corrupção.
Ele deve olhar para sua própria conduta e ver se seu protesto é justo. Não será apenas um desabafo de alguém que está enraivecido por não participar também da roubalheira? O Barão de Itararé dizia: “Ou o Brasil se moraliza ou locupletemo-nos todos”. Como esta última alternativa é impossível de ser alcançada, a única via é uma mudança no padrão de conduta do brasileiro médio para que, no futuro, o dinheiro dos impostos seja melhor utilizado. Que vá para a saúde, para a educação, em suma, para o bem da sociedade. E não para o bolso de meia dúzia de pilantras.
Obs.: Escrevi este texto em 40 minutos. Será que passaria na prova do ENEM?