Estatuto da Criança e do Adolescente: 19 anos de cidadania infanto-juvenil

(*) Por Antônio Coquito

O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) completa 19 anos no dia 13 de julho. Vale atentarmos que em 2009, une-se a esta agenda, a comemoração dos 20 anos da Convenção Internacional dos Direitos da Criança da Organização das Nações Unidas (ONU). Também, a Oficina Católica Internacional pela Infância (BICE) lança o Apelo Mundial de Mobilização pelas Crianças do Mundo. Somando-se a estas, o Brasil vive uma intensa agenda de Conferências dos Direitos da Criança e do Adolescente. Toda esta movimentação nos desafia no cenário das políticas públicas, para a sociedade brasileira e, por que não dizer, do mundo na defesa de um novo tempo para meninos e meninas.

Conversei, nesta matéria, com três pensadores que contribuíram na construção da Lei Aniversariante – 8.069/90. São eles: o professor e consultor Antônio Carlos Gomes da Costa, o salesiano Irmão Raimundo de Rabelo Mesquita e, também, o coordenador da Associação Nacional dos Centros de Defesa da Criança e do Adolescente (ANCED) e procurador de justiça aposentado Wanderlino Nogueira. Todos eles tiveram presença marcante nos debates da defesa, garantia e promoção dos direitos da criança e do adolescente. Eles falam dos caminhos percorridos e do que deve ser perseguido para ampliarmos a cidadania dos meninos e meninas brasileiros.

Fruto de intensa mobilização da sociedade, o ECA é um marco na análise e no jeito de fazer política pública no Brasil. Ele se tornou referência para países e organismos internacionais no que se deve percorrer para o pleno desenvolvimento da infância e adolescência. Os movimentos sociais, a sociedade civil organizada e diversas lideranças e agentes comunitários tiveram, e tem, uma importante parcela de contribuição nesta história de transformação da agenda social para a infância e adolescência.

Trajetória percorrida

Em quase duas décadas muito se fez, mas o desafio da mudança de paradigmas continua a desafiar os defensores dos direitos. Ao analisar a assimilação, pela sociedade brasileira, do princípio da prioridade absoluta, Antônio Carlos pondera que apesar de termos distâncias enormes a serem superadas, o Brasil está no caminho certo no que se refere à Doutrina de Proteção Integral.” Falando dos 19 anos, o professor sugere que “devemos fazer o exercício de refletir profundamente sobre os acertos e erros de luta e trabalho”.

Para Wanderlino Nogueira, coordenador da ANCED, os 19 anos do ECA apontam “o desafio na construção da integralidade na proteção dos sistemas de políticas públicas e sistemas operacionais”. Ele fala da necessidade imprescindível da prática articulada da prioridade absoluta nos poderes judiciário, legislativo.. “Nosso ordenamento político-institucional foi mais lerdo no processo de adequação aos princípios de direitos humanos e às normas e regras do Estatuto”, constata.

Para o salesiano Ir. Mesquita, existem muitos dilemas a serem enfrentados. Um deles é o cumprimento da legislação em toda sua extensão. Ele fala do distanciamento entre a realidade e o previsto legalmente para gerar cidadania. “Parece que é uma característica dos nossos políticos e da nossa sociedade não se interessarem pelos direitos, pelo que está declarado numa legislação, e exigirem o seu cumprimento”, enfatiza. Para ele, após 19 anos, a fragilidade do funcionamento dos Conselhos Tutelares (CTs) é um grande problema a ser superado. “Existem gestores públicos, juízes e promotores que desconhecem a função dos CTs”, aponta Mesquita.

Foco das ações

Questionado sobre as intervenções políticas e estratégicas a serem priorizadas, o professor Antônio Carlos lembra os momentos pós aprovação do Estatuto. Citando as definições traçadas pelo grupo de redação, na época, ele afirma que foram definidas três grandes linhas de ações e que são válidas ainda hoje: “1. Mudanças no panorama legal,; 2. Reordemanemento das Instituições Executoras das Medidas Protetivas e Socioeducativas em conteúdo, método e gestão e 3. Melhoria das formas de atenção direta, preparando os operadores da política de atendimento para compreender, aceitar e praticar o novo paradigma”.

Em muitos municípios, ainda falta capacidade política para entender que o Estatuto não é uma disputa de forças e poder. “Os nossos governantes não assimilaram para que e o porquê do Estatuto da Criança e do Adolescente”, destaca Irmão Mesquita como um desafio da ação política a ser priorizada. Ele defende uma ampla conscientização dos representantes no executivo, legislativo e judiciário no sentido de que “o ECA , os Conselhos de Direitos e Tutelares são colaboradores na administração e solução dos problemas da infância e adolescência nas cidades; bem como nos Estado e na União”.

Ao vislumbramos o cenário da dignidade das crianças e adolescentes do Brasil, nos deparamos com a necessidade de encurtar a eficácia e a efetividade das políticas públicas. Antônio Carlos defende uma ação co-responsável e a qualificação para atuar na área da infância e adolescência. “Formação de formadores” e a “organização de um amplo arco de forças, envolvendo governo, mundo empresarial e organizações do Terceiro Setor”, propõe. Para ele, “só assim seremos capazes de fazer a travessia entre a política de atendimento que temos e a que queremos”.

A interconexão das políticas é apontada por Wanderlino como a necessidade do momento. Definida como “ambiência sistêmico-holística, ele diz que é hora de “todos os operadores do sistema de garantia estarem articulados e integrados, e convergirem, conseqüentemente, para a garantia dos direitos da criança e do adolescente”, defende e amplia “mais do que para o fortalecimento de nossas próprias corporações e entidades”. No campo político, ele chama a atenção para o momento de “sermos multidisciplinares, multisetoriais e multiprofissionais na defesa e garantia e promoção dos direitos”.

Protagonismo: promessa do séc. XXI

Pautado na visão da criança e do adolescente como sujeito de direito, o protagonismo infanto-juvenil vem construindo história e mudando o jeito de ser e fazer de organizações não governamentais (ONGs) e Órgãos de Governo (OGs). O professor Antônio Carlos considera que o protagonismo juvenil será a grande agenda do século XXI. O modelo de participação política protagonista é, para ele, “o maior desafio da pedagogia social brasileira”. O professor fala com otimismo que, pelo protagonismo, vamos fazer acontecer uma grande ação educativa. “Neste momento, o Estatuto sairá definitivamente do papel”, fala efusivamente.

Investir e ampliar a participação das crianças e adolescentes como elemento transformador. Mesquita vai além,chamando a atenção para a falta de um projeto pós adolescência. O adolescente precisa de um projeto mais amplo, que não fique numa condição circunstancial, mas que promova um engajamento posterior. Ele explica que “o protagonismo precisa ter uma continuidade intensa e profunda, dando espaço para participação nas comunidades onde vivem os adolescentes e na sociedade de modo geral”. Mesquita aponta que o adolescente-jovem deve ser agente do momento político, nos debates e reivindicações etc. Enfim, ser uma força de cidadania que se adquire e contribui na transformação da realidade brasileira.

Superar e inovar no modelo de participação de crianças e adolescentes. Wanderlino esclarece que é “preciso empoderar o cidadão criança e o cidadão adolescente, para que possam atuar lado a lado com os adultos nos eventos políticos”. Um jeito de fazer que não promova, segundo Wanderlino, “subordinações ou manipulações ou o uso de uma excludente linguagem jovem e outros mecanismos de alienação e de manutenção da dominação adultocêntrica”. E defende “eles não são massa de manobra, são sujeitos da História, sujeitos de direitos”.

(*) Antônio Coquito é jornalista socioambiental com especialização em Marketing e Comunicação com ênfase em temáticas sociais -Terceiro Setor- Responsabilidade Social - Políticas Públicas. Também, Também em Comunicação e Direitos Humanos com ênfase em Educação e Cidadania

Antônio Coquito
Enviado por Antônio Coquito em 12/07/2009
Código do texto: T1696240
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