Um caso inédito

UM CASO INÉDITO

Meu pai era o electricista encarregado e responsável pela Central Eléctrica numa terra do Norte de Angola, Chamada Santo António do Zaire.

Os motores que abasteciam a Vila, eram motores fracos e era raro o dia em que não entravam em pane. Sempre que faltava a luz em casa de alguém, lá vinha o criado dessa pessoa a casa do meu pai, avisar que em casa do Sr. (A, B ou C,) não havia luz.

Meu pai pegava na sua bicicleta e fazia os 600 metros até à central para resolver o problema. Naquela altura e naquela terra, era tudo rudimentar e só a sabedoria e o profissionalismo do meu pai, conseguia manter a luz ligada 6 horas por dia, isto é das 18H até às 24H. A partir dessa hora, os candeeiros a petróleo entravam em cena.

Era normal naquelas terras, os funcionários públicos serem substituídos de 4 em 4 anos, e quando este caso aconteceu, tinha chegado à Vila um novo Administrador, que a minha madrasta ainda não conhecia.

Ora certo dia, desencadeou-se uma grande tempestade, de chuva, vento e trovoada, daquelas que só acontecem nos trópicos. Devido à grande ventania, os fios da via pública, embaraçaram-se, provocando uma data de curto-circuitos, causando o corte de energia na maioria das casas da Vila e uma delas foi a casa do Administrador, que era a figura pública mais importante da terra.

Nisto batem à porta de casa e minha madrasta foi abrir: era um criado do Sr. Administrador dizendo que faltara a luz em casa do patrão e que este tinha visitas. (Nesse dia o Governador Civil, cuja residência era em S. Salvador do Congo,) estava de passagem por S. A. Do Zaire, para seguir no dia seguinte para Cabinda.

Minha madrasta, disse-lhe então, que dissesse ao seu patrão que o electricista estava no banho mas que iria de imediato saber o que se estava a passar. Meu pai vestiu-se, agasalhou-se, vestiu o impermeável, pegou na bicicleta e partiu rumo à Central.

Batem novamente à porta, minha madrasta volta a atender e era novo emissário, que trazia a notícia ( Que em casa do Sr. Administrador, não havia luz). Minha madrasta, uma vez mais informou o rapaz, que meu pai já tinha saído de casa a fim de resolver o problema.

Mal tivera tempo de fechar a porta, e já outro criado estava com o mesmo recado, da falta de luz em casa do Sr. Administrador. A história começava já a tornar-se maçadora. Cheia de paciência minha madrasta lá despachou o moço de recados e dez minutos depois, batem de novo à porta, mas com uma certa violência.

Minha madrasta já irritada, abre a porta de repelão e sem ver sequer quem era o personagem que ali estava, diz de um fôlego só: - Já sei! Falta a luz em casa do Sr. Administrador e ele tem visitas… Pois olhe, eu sou a mulher do electricista e também não tenho luz.E continuava: está a ver ali aquele coto de vela a arder? (e dizendo isto apontava para cima da mesa onde se encontrava um prato com uma vela meio consumida.) Quando aquele acabar, não tenho outro e olhe que não me queixo. Quando acabou de pronunciar as ultimas palavras, reparou então num Senhor todo bem-posto, que olhava para ela perplexo, sem saber ao certo o que dizer àquela pessoa que tinha despejado aquelas frases todas quase sem respirar.

Mas ainda assim e sem mudar o tom de voz disse: Mas afinal o que é que o Sr. deseja?

O sujeito tartamudeando respondeu: É que não tenho luz lá em casa, tenho visitas e vinha pedir ao seu marido se dava um salto lá a casa para verificar o meu quadro eléctrico.

Responde-lhe então minha madrasta já mais calma. Olhe, ele não está neste momento mas assim que ele chegar, dar-lhe-ei o seu recado. Mas quem é o Senhor?

EU SOU O ADMINISTRADOR DE CONCELHO e cheguei ontem…

(Podem imaginar a cara da minha madrasta? Sei é que nos 4 anos seguintes, fomos sempre bons amigos.)

xica
Enviado por xica em 28/04/2009
Código do texto: T1565023
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