Literatura: múltiplos conceitos para o termo

Dentre os diversos conceitos elaborados por teóricos para definir o termo “literatura”, não há um que possa ser considerado absoluto, apesar de que a grande maioria deles converge para um mesmo sentido. Aqui serão listados e analisados alguns desses conceitos, sabendo, contudo, que não é possível esgotar o assunto, devido à sua amplidão. Além do que, nem todos os teóricos defendem a relevância de se formular uma definição para o termo.

“Literatura”, até meados do século XVIII, designava de uma maneira ampla, qualquer obra escrita, entre elas, a literatura como é hoje entendida. O termo está desde o início da civilização ocidental relacionado ao texto escrito e confundia-se com a própria cultura. Estava ligada ao ensino, à aprendizagem, à formação do homem letrado. Segundo Samuel (1999, p. 33)*:

A restrição do entendimento da literatura ao ficcional é decorrente de momentos históricos e não necessariamente da natureza do literário. O Renascimento é marco importante como início de tal restrição. [...] As transformações políticas por que passou a Europa a partir do Renascimento, com a criação de diferentes estados também contribuiu para restringir o conceito de literatura.

Consideremos os dois significados históricos do vocábulo “literatura”, de acordo com Sousa (2004, p. 40): “até o século XVIII, a palavra mantém o sentido primitivo de sua origem latina – “litteratura” - significando conhecimento relativo às técnicas de escrever e ler, cultura de homem letrado, instrução”. Depois, a partir da segunda metade do século XVIII, “o vocábulo passa a significar produto de atividade do homem de letras, conjunto de obras escritas, estabelecendo-se, assim, a base de suas diversas acepções modernas”. (Id, 2004, pág. 40).

Ainda segundo Sousa (2004, p. 41), costuma-se definir “literatura” como o conjunto de produção escrita de uma época ou país (donde expressões do tipo “literatura clássica”, “literatura oitocentista”, “literatura brasileira” etc.). Este conceito é passível de discussões polêmicas, pois quando se conceitua “literatura” como produção escrita, exclui-se a produção oral que, como se sabe, antecedeu ao produto tipográfico, e se constitui importante manifestação cultural de um povo. Aqui não será aprofundado este tema, pois, apesar de sua relevância para os estudos literários, foge ao propósito deste trabalho.

Dentre as inúmeras variações do conceito de “literatura” recorrentes na atualidade, encontramos “o conjunto de obras distinto pela temática, origem ou público visado – derivando daí expressões do tipo “literatura infanto-juvenil”, “literatura de massa”, “literatura feminina”, “literatura de ficção científica” etc.”. Relacionado à idéia de conjunto de obras escritas, conceitua-se “literatura” como bibliografia sobre determinado campo especializado do conhecimento – de onde surgiram expressões do tipo “literatura médica”, “literatura jurídica”, “literatura sociológica”. E também “disciplina que procede ao estudo sistemático da produção literária”. Há ainda a definição pejorativa e figurada de “literatura” como expressão afetada, ficção, irrealidade, frivolidade.

Há teóricos que não consideram a definição de “o que é literatura” uma questão primordial para o estudo literário, por entenderem que hoje não há necessidade de separar os textos considerados literários dos não-literários. Além do que, nos textos classificados como não-literários pode-se verificar a presença de literariedade, o que torna a distinção metodológica bastante complexa. Este é o entendimento de Culler (1999, p. 26), que a respeito do assunto, afirma:

Para os estudantes e professores de literatura hoje, há uma gama inteira de projetos críticos, tópicos para ser e sobre os quais escrever [...] em que você pode lidar tanto com as obras literárias quanto com as não-literárias. [...] Mas tanto as obras literárias quanto as não literárias podem ser estudadas juntas e de modos semelhantes.

A busca por uma definição de “literatura” pode implicar o risco de excluir, reduzir as funções da literatura. Freqüentemente, define-se o termo com a pretensão de dizer o que é literatura em todos os tempos e lugares. Há certo grau de imposição do dever de ser, porque se quer que seja. O desejo subjetivo imposto a outros como objetivo:

Ao se dizer que a literatura é isso ou aquilo, pretende-se definir para o todo e sempre o que seja ou/e deva ser literatura, excluindo do espaço conceitual - e daí do objeto - a possibilidade de uma variação no espaço e no tempo, como também o fato de que características consideradas típicas de determinadas categorias - como gêneros literários ou escolas - possam em outros momentos e lugares não ser consideradas marcantes, enquanto traços secundários ou irrelevantes é que desempenham o caráter definidor. (KOTHE, 2002, P. 11).

Assim, reduzir o termo “literatura” a esse ou aquele conceito não é relevante para os teóricos, nem classificar tal texto como literário ou não-literário. Pode-se afirmar que, na prática, há várias concepções de literatura na mesma sociedade, variando no tempo de acordo com o momento histórico e social. É importante se ter a noção do que é “literatura”, levando-se em conta a literariedade e o contexto histórico, elementos essenciais aos estudos literários.

* A bibliografia completa encontra-se ao final do texto "Conclusão".