Amizade além da pressa
Vinícius de Moraes termina o texto Amizade com a frase: “a gente não faz amigos, reconhece-os”. Ao longo do texto, põe a amizade como sendo mais nobre que o amor, porque pode ser compartilhada por diversas pessoas.
Em uma época de tanto individualismo, em quem não se tem o interesse de dividir coisa alguma, parece ainda mais nobre um sentimento compartilhável, sem perdas, por todo um grupo. Esta saudável partilha é essencial para o homem, um ser sociável, que por meio das amizades pode ampliar seu meio de convívio.
A sociedade contemporânea nos faz desejar coisas descartáveis: copos, pratos, guardanapos. No meio-ambiente já vemos o resultado desta pressa que nos caracteriza. No entanto, não é assim tão simples perceber que nossos valores também se tornaram extremamente superficiais. Nos transformamos em mestres do pleonasmo às avessas. Consideramos descartáveis – qualidade dada a objetos – as pessoas. Exemplo disso é o número crescente de gente que procura relacionamentos por meio da rede mundial de computadores.
Sem conhecer o sorriso, a voz e até mesmo as lágrimas do outro, não é possível haver a “intimidade sem reservas” de que fala Montaigne, no século XVI, quando era inconcebível a idéia de que, um dia, as pessoas se declarariam apaixonadas através de uma máquina, por alguém que sequer tocaram.
Não há uma forma de se contrair amizade. Ela ocorre pela convivência, afinidade, confiança. Por isso reconhecemos os amigos, não os fazemos.
A amizade não deixa de ser egoísta por ser compartilhada. Quem tem alguém a quem chame amigo, põe nele parte de sua felicidade. E prefere fazê-lo feliz, respeitando-o e amando-o, para sentir-se bem. Assim como as competições podem ser positivas para o aprimoramento humano, o egoísmo pode gerar e manter a felicidade mútua.
“Amigo é coisa pra se guardar, debaixo de sete chaves, dento do coração”, assim fala a canção que, quando tocada, costuma ser cantada em coro, devido à enorme identificação das pessoas com ela. Tal música não raro atrai lembranças dos amigos que se foram, de quem voou e no pensamento ficou.