Maria Rendeira
Quantas e quantas noites Maria passou acordada esperando o seu amado.
Que numa tarde de outono pegou seu barco e entrou mar a dentro.
Então Maria resolveu tecer uma colcha de renda.Para o tempo passar mais
depressa
e a saudade doer mais devagar.
Eram pontos e mais pontos e a dor da solidão se escondia no rendar.
O povo não a via mais nas ruas.Seu rosto não era mais feliz.
Sorriso há muito não dava mais.Luz do olhar se apagou.Vida toda sem brilho.
As crianças não queriam mais dela se aproximar.Os amigos se afastaram todos
e outros tantos a chamavam agora de Maria rendeira.Maria que rendava pra
esquecer um grande amor.Maria que rendava pra ocultar a intensa dor.Anos e
anos se passaram.Fios
feitos remendados e desfeitos pra serem recomeçados.A colcha era tão igual
aquela saudade.Não terminava nunca.Fazia que acabava e começava de
novo.Maria esquecera de si.Maria se perdera no vento da ilusão.Nem percebera
que aquele amor não lhe bastava.Era tão pouco que mal lhe cabia no
abraço.Aquele homem que um dia se foi nunca havia feito dela uma mulher de
verdade.Mas apenas uma Maria que cumpria ordens.Recebia xingamentos e pouco
afeto.Uma Maria que não tinha vida própria e que quem sabe agora termina a
colcha e pela primeira vez tece a sua própria vida.