O velório

Parte de fora do salão, três amigos fumar cigarros e bebericam café ralo em copos plásticos.

"E você sabe a causa? Irene pergunta tentando falar baixo.

" Ouvi dizer que foi atropelamento..." responde Otávio.

" Não foi uma desavença num bar que acabou em tragédia?" Questiona Jofre.

Irene dá uma tragada profunda e com as palavras saindo entre a fumaça arremata:

" Pode ser que uma coisa foi a causa da outra..."

Os três concordam em silêncio e ficam calados por um tempo. Otávio é o primeiro a apagar a bituca no cinzeiro.

"Ele era um polemicista, gostava da discórdia."

Eu o achava um reacionário arrogante e chavinista, mas era um bom amigo." Irene dia olhando pra baixo.

"Reacionário eu discordo, era um iconoclasta chato pra caralho. Desmontava as certezas dos outros que se aproximavam, levava os debates à argumentos que beiravam um niilismo radical que afastava quem irritava profundamente quem não estava acostumado com a figura." Diz Jofre. "É melhor a gente entrar.

Alguns familiares e colegas de trabalham estão sentados em cadeiras cochichando baixinho.

"Lembro que ele queria ser cremado." Irene fala com a mão na boca se dirigindo à Otávio.

"Sim, morria de medo da catalepsia. Dizia que era melhor virar cinza do que acordar debaixo da terra"

Jofre acompanha a conversa enquanto se sentam um pouco afastados.

"Quem vai ficar com os livros?

"Não é hora pra isso! Censura Irene.

"Desculpa, desculpa." Jofre leva o dedo à boca.

Chega o funcionário da funerária e fala alguma coisa. Levantam o caixão e o colocam na van.

Otávio olha o relógio de pulso e pergunta:

"Vão pra onde agora?"

"Tenho que voltar ao escritório." Diz Irene.

"Vamos beber uma cerveja, são quase cinco horas." Propõe Jofre. Otávio acena com a cabeça concordando.

"É, isso seria uma coisa que ele faria. Vocês estão de carro?" Irene diz já convencida.

"Não, mas tem um boteco aqui perto. Volto de Uber, o Jofre mora a três quadras do cemitério"

O amigo balança a cabeça de cima pra baixo e já procura o maço no bolso da camisa.

O trio toma a calçada e segue caminhando devagar.

Rodrigo Margini
Enviado por Rodrigo Margini em 31/03/2025
Código do texto: T8298783
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2025. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.