O Velho Erasmo
No entardecer de um dia de trabalho no Vão do Moleque. no município de Cavalcante, de repente, o dia virou noite e o vento começou a assobiar pela mata. Como estávamos longe do nosso acampamento, e não dava mais para voltar com aquela chuva ameaçando cair, imediatamente, procuramos um lugar para nos abrigarmos. De repente, avistamos uma casa. Apressamos nossos cavalos e nos aproximamos dela o mais rápido possível, e em poucos minutos chegamos. Era uma casa isolada no meio do mato, porém, não havia ninguém lá. Logo o mato desapareceu entre as rajadas de água e vapor que vinham de todas as direções. Foi uma chuva longa, e forte, o suficiente para aumentar o volume dos córregos daquela região. Quando os primeiros pingos anunciavam a chegada da chuva, descemos dos animais e entramos na casa vazia. Era um lugar que dava arrepios”, disse um colega, assim que colocou os pés na sala e se sentou no banco que havia ali. Aquela casa velha, sombria, cheirando a mofo não oferecia nenhum conforto. Após alguns minutos de chuva, vimos surgir no retângulo da porta, um senhor que a sorrir nos disse ser o dono da casa. Com um leve movimento ele entrou. Era um senhor de idade, simpático, magro, estatura média sob um chapéu grande demais para sua cabeça que juntamente com a capa, lhe protegiam da chuva. Depois dos cumprimentos de boa noite, disse que éramos bem-vindo a sua casa, embora tudo indicasse que não morava ninguém naquele lugar havia muito tempo. Falou que vivia sozinho ali, e nos ofereceu qualquer tipo de ajuda. O que significava simplesmente que podíamos usar toda a dependência da casa. Um dos colegas, pois éramos três, foi a cozinha e depois de gastar alguns palitos de fósforo começou a fazer o jantar. Após o jantar armamos nossas redes na sala e nos deitamos. Naquela noite ninguém conseguiu dormir direito, porque ele ficou em pé na cabeceira das redes e começou a falar sem parar. Apagamos as lanternas e ficamos em silêncio, esperando que ele fosse para seu quarto descansar. Mas, o silêncio da noite, pois a chuva já havia passado, foi rapidamente, quebrado pela voz daquele homem que não parava de falar, enquanto balançava as redes. Contava umas histórias mirabolantes de onças encantadas que viravam cupim quando acuadas. Em cada história havia uma nova surpresa em relação à anterior e só nos restava a esperança de que ele se cansasse e fosse dormir. Aquela cena durou até o momento que o dia clareou.
A manhã chegou com os pássaros cantando e a mata banhada por um sol radiante de primavera, anunciando um bom dia. Levantamos e o procuramos pela casa, mas não o encontramos. O velho havia desaparecido. Pensamos que teria ido trabalhar na roça. Fiquei imaginando como seria a vida dele sozinho naquela casa sem ninguém para conversar e contar suas histórias, seria esta sua vida de verdade. Ele não reclamava, e eu tinha certeza de que se manteria assim, até seus últimos dias. Pouco depois do café apressado, selamos nossos animais e antes de partirmos deixamos para ele as sobras dos mantimentos que tínhamos levado, arroz, carne seca, café e macarrão. No caminho de volta falávamos e riamos a respeito do que aconteceu naquela noite, quando encontramos um senhor montado em uma mula que logo nos perguntou onde passamos a noite. Dissemos que foi na casa de senhor Erasmo, foi este o nome que ele nos deu, por sinal nos tratou muito bem. Mas não pudemos despedir dele, pois logo que o dia amanheceu ele não estava mais lá. Desapareceu. Ele assustado disse: É impossível vocês terem encontrado o Erasmo. Lá se vão cinco anos que ele morreu...”.