Realidade de brinquedo
Em uma manhã aleatória, o bilionário Elliot R. acordou dentro de suas próprias realizações. Se viu em um espaço liminar amarelado, que poderia algum dia ter sido a sede da finada empresa da família.
Primeiro ficou em choque: gastou o não-tempo do lugar tocando os próprios bolsos e buscando alguma coerência na pele. A carteira ainda estava ali. Inútil. Resolveu ecoar de forma ritmada para fugir da própria angústia e o sapateado o levou até uma sala com um complexo presépio no centro.
Entre engrenagens, fios e cordas, uma cidade inteira funcionava autônoma. Pequenos bonecos humanóides se cumprimentavam, carros elétricos se recarregavam e seguiam para o próprio destino, animais de madeira enfeitavam e avivavam todo o cenário.
Tomou fôlego tomando notas mentais de cada uma das interações que aconteciam: algumas travas nos movimentos deixava claro que não era algo novo. Embaixo de uma árvore de papel crepom, com olhos que procuravam um ponto de intromissão, localizou um buraco que parecia o recorte de um cofre. Retirou uma moeda da carteira e inseriu no retângulo vazado sem instruções.
Como em uma caixinha de música, o espetáculo passou a ser para ele. Os bonecos que antes interagiam entre si, o encaravam com coreografias completas, os carros em corridas perfeitas e os animais com mil piruetas. E como em uma caixa de música tudo então cessou, apenas para dar lugar a mais uma moeda e mais uma apresentação.
O último estalo da apresentação era seguido pelo encontro tosco da moeda com o metal da parte interna da mesa. "De novo!". Estalo, clique, festa e estalo, clique, festa e estalo. Mais uma moeda era retirada do vortex infinito daquele pedaço de couro.
O traiçoeiro não-tempo o impedia de pensar. Quando uma voz dentro da sua cabeça o questionou sobre a sua vida real, riu consigo mesmo. Não queria nenhum outro tipo de realidade, só o brinquedo.