Sorte
Um cachorro mancando com a pata dianteira direita levantada passa em frente ao portão de Seu Valdomiro. Ele o abre e atravessa a rua em direção ao bar.
São mais ou menos nove e meia da manhã. Valdomiro enrola as portas de aço cor de laranja. Primeiro a face leste e depois a da esquina. Logo em seguida já chega Paulinho, cliente antigo.
—Bom dia Mirão. Sonhei com sangue essa noite, coloca cinco reais no porco por favor.
— Pro meio-dia?
— Pode ser.
— Tá feito.
Paulinho deixa uma nota de dez reais e aproveita pra tomar uma dose de licor de jurubeba.
— Falou, até mais tarde. Na hora do almoço eu volto.
Paulinho se despede e vai para sua oficina onde conserta TVs, controles remotos, ventiladores etc.
Valdomiro segue sua rotina: verifica o estoque, anota num caderno o que precisa ser pedido, faz algumas contas enquanto ouve as notícias pelo rádio a pilha que o acompanha há mais de vinte anos.
Enquanto seca um copo americano com um pano velho, porém limpo, surge uma figura trajada com uma camiseta encardida, uma calça jeans puída e um par de chinelos.
— Pois não cidadão.
Valdomiro diz em tom metálico.
— Uma dose de cachaça curtida em amburana, por gentileza.
Valdomiro está desconfiado, acha que o sujeito vai aprontar alguma. Serve a dose ressabiado, porém mantém o semblante impassível. O homem bebe, tira uma nota de vinte do bolso e deixa sobre o balcão.
— Pode ficar com o troco... Ah, algo me diz que vai dar pavão na cabeça, mas eu não aposto.
Toma a rua e caminha. Valdomiro fica com uma pulga atrás da orelha.
Faltando quinze minutos pra uma da tarde Paulinho aparece pra mais uma dose.
— E aí Mirão, qual foi o resultado?
— Pavão...