Jó na montanha
Jó encontrava-se desesperado. Um grande vento causou a morte de seus filhos e de seus animais e destruiu sua casa e suas plantações. E ainda, uma chaga passou a tomar conta de todo o seu corpo. Sentado numa pedra, Jó se lamentava, chorava e se coçava insistentemente com o que tinha na mão.
Entra sua mulher inconformada.
- Mulher: Maldito tu és, Jó! Você atraiu todas essas pragas que nos atingiram neste dia. Nossos filhos, todos mortos! Quem jamais perdeu tudo num só dia?! Sim, és maldito! Faça agora um favor e se mate para que não venha mais maldições sobre este lugar! Maldito foi o dia em que te conheci e gerei teus filhos.
- Jó: Humilhado estou e triste até a morte. Não entendo o que fiz ao Criador para receber tamanho castigo. Sim, morrer é melhor que viver. Irei me lançar do pico daquela montanha para que minha vida se vá e cesse toda essa maldição. Sem demora irei.
Jó, a caminho da montanha, encontra seu amigo, Laico.
- Laico: Ah Jó, para onde vais?! Soube das más notícias. Que tragédia! Mas o que faz sozinho aqui? Deixe-me abraçá-lo.
- Jó: Solte-me Laico, preciso seguir o meu caminho. Um vento do Senhor levou tudo o que eu tinha e agora ao vento me lançarei a partir do pico daquela montanha.
- Laico: Oh Jó, não digas assim! Não faças tal! Ainda respiras e estás de pé. Ainda ouves e falas. Consegues me ver e estás lúcido. Há muita vida ainda em ti. Não faças tal coisa, ainda que a dor seja tanta!
- Jó: Da vida não quero mais nada. Comer, beber, dormir, enxergar, andar… do que adianta se minha alma está esquartejada, cega, muda e morta? Deixe-me seguir meu caminho, Laico.
Laico permanece estático em seu lugar e Jó prossegue em seu caminho. Próximo ao pé da montanha, Jó encontra um segundo amigo, Lázaro.
- Lázaro: Ai Jó, que dor! Que tragédia! Triste é a vida, sim, tristíssima. E és um homem tão bom, tão justo, tão correto! Quando estive caído como morto naquela estrada, foi você que me levantou e cuidou de mim. Deixou-me sob os cuidados de seus filhos em sua casa. E agora, tudo se foi! Não pode ser, Jó!
- Jó: Lázaro, bom amigo. Guarde suas lágrimas para quem ainda pode ser digno de misericórdia, pois o meu caso não vale ser mencionado ou lembrado para que não traga dor a quem ouve. Esqueça de mim, do meu nome e da minha família. Para o seu bem.
- Lázaro: Jó, permita-me cuidar de você como cuidaste de mim. Permita-me abrigá-lo em minha casa como um dia me acolheste na sua. Sou teu servo Jó, tens a minha vida se quiseres!
- Jó: Não, Lázaro. Não permita que a maldição que caiu sobre mim chegue perto de ti e de seus filhos. Deixe-me, Lázaro, deixe-me.
Jó segue sua subida à montanha e chega até o topo. Lá, encontra Satanás a sua espera.
- Satanás: Jó, o que pretendes fazer aqui? Vim como um raio ao saber o que disseste a sua mulher. Jó, não cometas tal ato!
- Jó: Tens a forma como de um animal do campo mas fala como um de meus amigos. Quem és?
- Satanás: Ah Jó! Assim como a ti também perdi tudo num só dia. Perdi minhas asas de anjo, minha casa, meu reino, meus amigos. Tudo em um momento acabou. Mas veja, até para um filho da rebeldia como eu houve misericórdia. E no meu caso, havia culpa em minhas mãos. Mas mesmo assim, o Criador não me matou, poupou a minha vida; e ainda, me lançou numa terra formosa cheia de gostosuras. Acredite Jó, ainda podes viver uma boa vida, mesmo deformado, mesmo sendo outro. Você terá apenas que aceitar que não és mais o mesmo. Venha comigo, conheço como é ser castigado duramente pelo Criador, mas prometo que há ainda uma boa vida para você.
Jó decide ir com Satanás, que o leva a uma grande floresta para viver junto aos animais selvagens.