O enigma das Sombras
Naquela noite, quando acordei, toquei o braço dela e ele estava gelado.
Senti medo. Não sabia como agir e fui em direção à porta, depois ganhei a rua, na qual tudo era quietude. Mesmo assim, segui sem rumo colando-me às paredes e esgueirando-me nos vãos escuros, sob as plantas e árvores, até que cheguei ao Parque.
Não sei dizer o que me atraiu, mas eu sabia que aquele era o lugar.
Andei pelo Parque sentindo o frio da madrugada, ouvindo murmúrios, sons abafados, bafejos, ganidos.
Abra os olhos – disse-me uma voz.
Não posso. Não vês? Respondi.
Abra os olhos, por favor. Não tenha medo.
Forcei uma abertura mínima nas pálpebras e vi que ele era como eu, apenas uma Sombra.
Abra mais os olhos e abaixe a cabeça, olhe-se no espelho d’água.
E lá estava eu refletindo a imagem da minha linda dona.
Mas, eu não sou ela.
Claro que não. Somos Sombras.
E agora, o que acontece?
Vamos ficar aqui sentados no banco até o sol chegar.
Mas, será o nosso fim!
Sim. Será.
E se eu não quiser?
Não temos mais utilidade.
Significa que a minha dona morreu?
Sim.
Então vamos nos desintegrar?
Sim.
Neste exato momento, notei que havia mais de nós por perto. Uma mulher com o filho no colo, um senhor grisalho e até um cachorrinho.
Assim, quando os primeiros raios do sol foram surgindo, nossos átomos foram se desintegrando em luzes coloridas e começaram a pairar desordenadamente, subindo e subindo, para se confundirem com o azul do céu e a brancura das nuvens.
Ainda vamos voltar algum dia? Perguntei.
Não sei. Ninguém sabe. É um ciclo. Um enigma.