A BRUXA E O VAMPIRO

Um vampiro e uma bruxa conheceram-se em uma cidade do interior. Estavam envolvidos em um grupo de trabalho holístico. Depois que o serviço encerrou, mantinham contato por rede social.

O vampiro observava o movimento da bruxa. Pensou tentar uma primeira abordagem. Queria convidá-la para jantar.

Tinha marcas. Havia se envolvido em vários relacionamentos ao longo de sua eternidade. Machucou várias mulheres e monstras. Fora machucado.

Depois de alguns séculos, um novo ser chamava-lhe a atenção. Queria saber se o sangue dela era azul ou verde? Qual seria o seu gosto? Daria vontade de mais ou iria amargurar a sua solidão de gosto neutro. Que tempero seria aquele que depois de tanto lhe abria o apetite?

Era uma bruxa. Ela poderia prendê-lo em uma gaiola quando estivesse em sua forma vulnerável. As raspinhas da asa dele poderiam ser utilizadas para mandinga.

Sentiu necessidade de consultar uma psicóloga. Estava inseguro. Não sabia lidar com aquele sentimento. Não queria mais viver um ciclo vicioso. Depois que via a vítima extirpada em sua frente, retomava a consciência e percebia o que havia cometido. O outro fora transformado em espelho. Nada mais horripilante do que a sua própria imagem defronte de si.

Observou a natureza e entendeu que tudo que existe precisa de alimento: plantas fazem fotossíntese, os animais, incluindo os humanos, comem seres vivos e mortos, fungos se alimentam de seres em decomposição e os vampiros sugam sangue. Estava tudo certo.

Decidiu viajar por alguns dias. Arrumou a sua casa. Desfez-se do que não servia mais. Abriu espaço.

Enviou uma mensagem para a bruxa.

- Nunca mais voltamos a nos encontrar? Como você está?

A bruxa que que sempre era muito ela, respondeu:

- Quando é para duas pessoas se encontrarem, não precisa de esforço, flui.

- Costumo controlar a ordem natural das coisas. Se não tiver compromisso, gostaria de convidá-la para jantar.

- Um vampiro controlador querendo sair com uma bruxa? Hahahaha!!!

- Estou correndo risco de virar tempero de unguento.

- Não utilizo tempero barato.

- Sou envelhecido, funciona com vinho.

- Não faço vinho.

O vampiro estava decidido.

- Este é o meu medo. Dois monstros não têm muito o que perder. Concorda em sair comigo?

- Prezo pela minha autonomia de voo.

Naquela penumbra de lua nova, alguém viu uma bruxa na sua vassoura ao lado de um morcego. Um gato passou por cima do muro e quebrou o vaso. O uivo dos cães terminou no canto do urutau.

Texto publicado no Facetubes:

https://www.facetubes.com.br/noticia/2764/joema-carvalho-escreve-sobre-qa-bruxa-e-o-vampiroq