UMA NOITE COM LUPÉRCIA
Jovem gosta de fantasiar, de viver mentalmente momentos delirantes, de sonhar acordado. A gente quando na idade dos quatorze, quinze anos, na flor da idade, como dizem, tem sentimentos que só quem os tem é quem conhece. E eu vivi momentos fantasiosos quando tinha treze para quatorze anos, apesar de ser um menino bobinho, acanhado e muito tímido. E essa timidez me deixou muitas vezes em maus lençóis. Lembro que certa vez eu fui fazer um trabalho de pesquisa na biblioteca da escola onde estudava, a pedido da minha professora, era uma pesquisa sobre atividades sociais. Era a hora do recreio e eu aproveitei esse horário para me concentrar mais, sozinho ali sem a interferência dos colegas eu poderia pesquisar tranqüilamente sem ser incomodado. Lanchei rapidamente meu pão com doce e degustei toda a garrafinha de suco de laranja que minha mãe tinha feito prá mim. Quando estava com o livro indicado pela professora em mãos, eis que surge a minha frente uma figura que já foi personagem dos meus sonhos: Lupércia. Era uma garota meio recalcada que costumava apontar o dedo para os colegas e acusá-los de algo que nem sempre eles tinham feito. Era uma chata, segundo eles, mas para mim ela era uma menina igual às outras, já que para mim nunca tinha insinuado nada. Eu a admirava, era bonita e tinha um jeito especial de olhar para as pessoas quando ela as admirava, mas eram poucas, no geral ela era considerada uma chata.
Esse pensamento me fez recordar um certo dia quando tínhamos feito uma prova e nós nos saímos bem. Ela não era da minha classe, mas havia uma interação entre os alunos e a gente sabia dos assuntos que caíam nas outras salas de aula, então a gente conversou rapidamente sobre a prova aplicada. Fiquei feliz quando ela me elogiou, momento em que a elogiei também, aproveitando o ensejo. Senti seu olhar penetrante em mim, o que me deixou confuso, mas não passou disso, ela se foi e eu fiquei por ali zanzando imaginando aquele seu jeito. Ao entrar na sua sala ela me olhou discretamente, o que me deixou pensativo.
Mas voltemos a biblioteca, estava só eu e ela ali, desejei nesse momento aquele seu olhar penetrante, o que realmente aconteceu, porém de uma forma mais branda, o que não chegou a me "enloquecer". Ela também estava ali para fazer uma pesquisa e o assunto era outro, era sobre atividades indígenas. Me lembrei que tinha em casa um livro que poderia muito bem resolver o seu problema, mas esperei ela encontrar um livro que servisse para o seu trabalho. Ela não encontrou e ficou preocupada, então eu lhe falei sobre o livro que tinha, o que a deixou entusiasmada (intimamente eu também fiquei). Marcamos então para nos encontrarmos em minha casa, já que ela morava perto de mim. Fiquei radiante, ia ser maravilhoso, nem me lembrei mais que ela era uma chata, o que me interessava era recebê-la em minha humilde residência.
A noite chegou, jantei mais cedo e fiquei no portão esperando Lupércia, parecia um namorado ansioso a espera da namorada. Em pouco tempo ela chegou e me abraçou, coisa que nunca fez em todo o tempo que nos conhecemos. Entramos e ficamos no terraço onde tinha uma mesinha com o livro em cima, papel e caneta para anotações e pronto. Conversamos um pouco antes da pesquisa, em seguida passamos ao que interessava (além dela). Foi tudo perfeito, uma maravilha, Lupércia nem parecia aquela menina da escola, a minha impressão era que eu estava diante de uma figura fantástica a qual muito me envaidecia com a sua presença. Precisei ir até meu quarto em busca de algo que a impressionasse, lá eu tinha muitas bugingangas, coisas de menino. Quando eu tentava pegar um quadro de um super herói na parede ela surgiu atrás de mim e me abraçou por trás. Senti um calafrio danado, foi assim de repente. Depois ela me soltou bruscamente e me apontou o dedo, mas seu ar era de alegria, ela sorria. Fiquei mais tranqüilo. Ela me deu um empurrãozinho e eu caí sentado na cama, ocasião em que ela sentou em meu colo e me abraçou com força. Ficamos ali frente a frente, um olhando para o outro. Faltava alguma coisa e eu sabia o que era. Um beijo. E isso aconteceu por iniciativa dela, eu estava tão ababacado e tremendamente tímido que nem pensei nisso. Que beijo gostoso! Senti aqueles lábios carnudos unidos aos meus, uma química bem legal tomou conta de mim. Foram momentos que nem sei quanto durou. De repente umas palmadinhas em minha bochecha, aí eu saí do transe, "acordei". Ela então perguntou o que estava acontecendo comigo, pois segundo Lupércia eu "saí do ar", fiquei parado olhando pro nada. Meio chateado pedi desculpas e em seguida ela se foi, a hora estava se adiantando.