A Árvore Mãe
A Árvore Mãe
(26-12-2020)
Era um jardim, uma floresta ou uma praça. Não sei dizer ao certo o que era aquele lugar. Crie aí em sua mente com as características que vou te passar.
Haviam várias árvores. Grandes, pequenas, volumosas, fininhas, frutíferas, cheirosas, aconchegantes. Cada uma de um jeito. Mas no meio de todas elas havia a maior e mais antiga, de tronco mais grosso, de raízes mais profundas, de copa mais acolhedora: a Árvore Mãe.
Neste momento, acredito que você já deva ter criado em sua tela mental esse lugar sensacional. Se você criou, ele existe aí pertinho, mas já vamos falar sobre isso. Antes preciso descrever mais alguns detalhes.
Este era um lugar mágico, onde todos vivam em harmonia. Mas se por acaso, por ventura, sem querer, alguém sofresse de alguma dor de alma aí então esse alguém ia até a Árvore Mãe, se conectava através de um abraço, por exemplo, e ela, sábia, dava um conselho que acalmava. Não com palavras, na Natureza as palavras não são necessárias, na Natureza tudo se comunica através do coração.
Quando dois ou mais seres entram em conexão, sai do meio dos corações uma espécie de fio sutil, invisível, mas poderoso. Ambos os fios se encontram e aí a troca energética, a conversa, os sentimentos fluem.
Era isso que a Árvore fazia. Com os vegetais e minerais ela criava um fio de conexão através da terra, saindo de suas raízes. Para os seres voadores liberava o fio através de seus galhos, folhas e frutos, e para os seres andantes como nós, liberava pelo tronco, no abraço (acho que foi por isso que dei o exemplo lá em cima do abraço!).
Pois bem, um único abraço era capaz de juntar os pedaços antes despedaçados da alegria, trazer clareza, sabedoria e paz, e assim proporcionar uma genuína esperança por meio da reforma inteiror.
Se eu me alonguei nas descrições, perdoe-me. É necessário explicar, pois o ser humano, se algum dia teve contato com algum lugar do tipo ou parecido, foi há muito tempo e foram poucos e sortudos e há muito tempo se desconectou. Se tivéssemos esse poder, palavra nenhuma era necessária.
Não estou aqui diminuindo, menosprezando a importância das palavras. Sou escritora, trabalho com elas e para nós seres humanos hoje, desde tempos remotos, elas são preciosas. São o nosso tipo de conexão, e é graças a elas que agora te conto essa história. Mas naquele lugar, naquele tempo, o qual gastei parágrafos e mais parágrafos para descrever, elas, as palavras, não eram necessárias. Isso é somente um fato histórico, você, escritor ou contador de histórias, não fique bravo. (Ainda hoje e aqui, ouso afirmar, que muitas vezes um único olhar diz muito mais!).
Esse lugar mágico existiu desde sempre, acolhendo absolutamente todos que conseguiam lá chegar. Mas um dia, uma viajante, daqui desse nosso plano errante (denso e cheio de pedras no caminho), estava numa dessas estradas que você conhece, dessas que ligam as cidades, viajando à procura da felicidade. Tentara diversas vezes nos empregos, nos relacionamentos, nas paixões, no dinheiro. Levava consigo uma bagagem pesada, mas apesar de toda matéria que possuía, ali também existia um vazio enorme.
Parou debaixo de uma árvore qualquer, na beira de uma estrada de terra qualquer, pois estava exausto. Sobre sua cabeça havia uma nuvem negra de pensamentos raivosos e sob seus pés os inúmeros erros que ainda o acompanhavam (e ano após ano, só se acumulavam).
Cochilou e no meio do cochilo, uma porta no tronco da árvore qualquer, se abriu. Não sei dizer se foi obra do acaso ou se foi caso pensado, afinal a Árvore Mãe tinha o poder (acho que ainda tem!) de se comunicar com tudo e todos e todas as árvores de todos os lugares.
Mas por que ela abriria a porta para aquele homem? Por que deixaria ele entrar e não nós, seres de bom coração? Enfim, não cabe a minha julgar. O fato é que a porta se abriu, a cabeça do homem caiu e ele se viu dentro dela. E lá havia um portal, que o levou para o lugar sensacional.
A princípio entrou engatinhando, receoso, pois em toda sua vida só se metera em lugares sombrios (por escolha própria). Porém, não demorou muito tempo e foi tomado por uma estranha paz. E, como o bebê que já nasce sabendo sugar o leite materno, ele foi seguido por um instinto em direção da Árvore. A abraçou! E ela ia lhe falar, ou melhor, lhe passar uma informação importante, que mudaria toda sua história futura, todo o modo de ver sua história passada, que lhe traria sabedoria para viver o presente e aceitar o seu passado errante, que lhe curaria todas as dores que ele trazia sem saber desde a infância, que curaria sua própria criança, e isso lhe causaria a paz de saber que foi como foi, porque quem lhe fez mal, não fez por mal, mas por ignorância... Que proporcionaria finalmente a possibilidade de deixar para trás a nuvem negra da cabeça e o peso antigo dos pés.... Que traria a esperança...
Quando o homem acordou. O ego falou mais alto. Enquanto a Árvore não precisava de palavras, o ego se achava esperto e gritava. Gritou tão alto a ponto de trazer o pobre homem de volta. Ele então levantou e seguiu sua jornada rumo a nova cidade, ao novo emprego, ao novo de novo em busca da felicidade. Mas naquele coração, aquela nobre sensação de paz e tranquilidade já reverberava. Ele já não era mais o mesmo, alguma coisa havia mudado.
Já a Árvore continuava lá, no mesmo lugar, com a típica tranquilidade de quem tudo sabe, conhece o presente, o futuro e o passado. E no moço a ansiedade agora, mais que nunca se tornou algo ainda mais pesado. Necessidade de voltar e sentir o que a Árvore queria lhe ensinar.
E foi ele, dormir aos pés de muitas e muitas árvores, por muito e muito tempo. Na sua imaturidade o moço começou a pensar: “tenho certeza que lá se encontra a chave para a riqueza, o sucesso, o dinheiro, o poder” e quando ele encontrasse seria o rei do mundo.
Não digo que tudo isso seja imundo, não! A abundância é divina e eu também quero ter, mas ambição é diferente de ganância, e no rapaz, ainda eram poucas as mudanças que aquele momento tinha proporcionado. Ele queria tudo aquilo para pisar em quem um dia nele tinha pisado, ele queria ser idolatrado.
E mais, “que ideia fantástica! ”, pensou o “menino”. Ele, depois de ter tido acesso à toda sabedoria, cortaria a Árvore. Plano perfeito, assim ninguém mais teria direito de saber os segredos daquele lugar. Aprenderia tudo o que precisava ser aprendido e “pá”, cortaria o bem pela raiz.
Mas você, leitor meu amigo, já sabe de tudo isso o perigo. Nem vou perder meu tempo dando lições de moral e refletindo contigo. Não precisa ser um gênio para saber o defeito de tudo isso.
(Pausa, longa pausa)
Oi, voltei. Fui tomar uma água, comer um brigadeiro que ganhei de Natal. É finzinho de tarde do fim de dezembro, começou agora aqui uma chuva grossa, gostosa, dessas fortes e sem raio ou trovão, típicas do verão brasileiro.
Essa história da Árvore Mãe me veio na cabeça no comecinho de setembro, no fim do inverno, há duas estações. Só agora estou escrevendo, pois, todas as vezes que nela penso e repenso, sempre travo nessa parte da história.
Não quero que o moço consiga encontrar a Árvore, meu ego me diz que ele não merece. E se ele entra no lugar mágico e a mata? Não, ele não iria fazer isso, porque antes ela daria um sermão que iria direto ao coração e ele descobriria toda a verdade e entraria num processo de catarse doloroso.
E também tenho preguiça de te dizer tudo o que seria falado no sermão, porque acredito que você não tenha chegado até aqui, lendo palavra por palavra (e através delas criado uma conexão) para no fim ouvir um sermão.
Só sei que o lugar mágico existe dentro de você, está aí na frente, dentro, ao lado. Você também pode e deve encontra-lo e deixar-se sentir abraçado. Que delícia de abraço!
Quanto ao homem viajante de nuvem escura na cabeça e peso nos pés, como você terminaria sua história?
Juro que eu volto para terminar, mas preciso muito da sua ajuda!