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I
SENHOR JESSE JAMES JR. COMERCIANTE DE PRESTÍGIO

Meu pai me contava a história sempre que podia… e mais vezes do que eu aguentava escutar (risos). Vivíamos tempos de paz. Os bandidos se foram… Nos relacionávamos muito bem com os índios. As histórias de heróis, mocinhos, bandidos e donzelas eram contadas na hora do jantar por velhos patriarcas entediados que queriam impressionar as crianças.

Tínhamos grandes escolas, grandes colheitas, tínhamos trabalho nas minas. Nas estações ferroviárias e nas fábricas… Estava tudo bem. Mas é o que dizem… sempre está tudo muito bem; antes que fique tudo muito mal.

Me lembro perfeitamente quando cheguei na taberna pra começar o dia e lá estava ele… parado na porta. Um homem muito velho e cego, com um pano em volta dos olhos.

Mas ele era incrivelmente altivo, forte e musculoso. E não se lamentava como os outros mendigos. Apenas permanecia ali de pé, como um soldado. Ao seu lado, uma vasilha, ainda sem moedas. Atirei algumas e tive vontade de parabenizá-lo pela postura digna. Mas me contive. Não pude deixar de pensar nas histórias de meu pai sobre o Pistoleiro Vendado.

- “Deve ser assim que heróis se acabam…, pensei rindo, mas sem achar graça. No fundo eu nunca acreditei na existência do pistoleiro… Sei que ele existiu, mas não conseguia imaginá-lo na forma poderosa… e meio messiânica, que os antigos se referiam a ele.

No dia seguinte acompanhava meu pai, segurando-o pelo braço até a taberna. O velho precisava tomar um café forte, pra aguentar o dia. É… os dias estavam se tornando cada vez mais longos e pesados para o pianista da cidade. Quando meu pai viu o mendigo, parou no mesmo instante… tomado de muita emoção…

- “Filho! Aí está ele! Olha ele ali…”.

Ele tinha tantas lágrimas nos olhos… Meu pai não era de chorar. Parou em frente ao homem, fez uma reverência e depois o abraçou…

II
CHICO: O COVARDE

Eu estava lá quando aconteceu. A esposa de Talbot (o nosso xerife… truculento PRA BURRO), estava grávida e não estava sendo fácil pra ela. A dona não vinha se sentindo bem. Quando entrou em trabalho de parto… acho que a cidade inteira escutou seus gritos. Eu estava lá!

Talbot agarrou um empregado pelo pescoço e berrou “tragam um maldito médico aqui, nem que precisem destruir a cidade até achar um!!”. Nunca tinha visto tamanho ódio e desespero num homem. Olhou pra mim e eu dei um sorriso amarelo. Me virou um tabefe que me fez perder um dente e o sangue desceu. “Não fique aí parado, seu pulha! Faça alguma coisa!”, grunhiu. E então eu saí correndo. Mas já era tarde e a moça morreu.

Foi então que o xerife pirou.

Era um homem perigoso, forte… e tinha os melhores cowboys, policiais corruptos e arruaceiros da cidade… agora todos cravados em seu bolso. Fez um exército pessoal, através de empréstimos, dívidas, chantagens e ameaças às famílias. Correu pela cidade a mensagem: “O xerife mandou matar todas as moças grávidas e todos os recém-nascidos, hoje à meia-noite!”. ÉÉ… PARECE MENTIRA HAN? Ele estava doido de pedra e a cidade esperando uma noite de horror… pra pegar aquele tal do Velho Testamento e fazê-lo dizer “uaaau...”.

III
EU MESMO, O JORNALISTA

Há anos atrás fiz fama por causa dele. Ouvi as histórias sem me importar se eram reais ou não. Ouvi o padre, o pianista, a dona da pensão… e a mulher que desapareceu… Pois foram as pessoas que tiveram contato direto com o Pistoleiro Vendado. Mas, vale ressaltar que toda a cidade unanimemente sustentava a história. Não haviam duas versões. Não haviam oposições e descrentes. E agora estavam dizendo que um mendigo surdo-mudo, era o pistoleiro em pessoa. Não pude acreditar. Esse não é final que eu teria escrito para um herói como ele.
Sempre achei que fosse uma espécie mistica de herói. Alguém imortal… que pudéssemos chamar num sussurro… em momentos de desesperança e injustiça. E esse momento novamente chegou e ele nada fez. Não era ele! Não podia ser ele! De modo algum!
Obs: Os próximos relatos foram colhidos para uma republicação da história que me fez famoso há mais de 10 anos. Agora com os novos eventos que sucederam e que eu pude VER e atestar que SÃO REAIS.


IV
AS ÚLTIMAS PALAVRAS DO VELHO JESSE
(parte 1)

A cidade parou! Não há esperança diante dessa loucura. Nunca fomos muito sociáveis com as cidades vizinhas – por causa de nossa postura de PAZ na situação dos índios -… e estamos completamente sós. E justamente os homens da lei que AGORA são a grande ameaça. O “Xerife Louco”… TALBOT… está prestes a destruir a vida de todas as famílias da cidade! O que podemos fazer, meu Deus? Tenho uma netinha por vir! Minha nora está grávida de uma menina! Uma princesa que se chamará DANIELLE...!

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Fui até o pistoleiro. Ele estava estirado no chão. Apático, indiferente. Contei o que ia acontecer… a tragédia que viria exatamente a meia-noite. Ele se sentou repentinamente. E pareceu genuinamente preocupado. Fez algo que pensei que morreria sem ver.

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O pistoleiro… velho… acabado… tirou a venda dos olhos. E o que vi não era o que imaginava. Não vi olhos cegos, feridos ou buracos negros. Mas vi lindos olhos, incrivelmente azuis. Que podiam me ver, com muita ternura e tristeza. Ele me olhou e deu um profundo suspiro. E calmamente me disse…

A ajuda virá..

V
CHICO, O COVARDE

Me deram uma arma. Eu nunca disparei uma arma. Nem mesmo pra caçar… Nem mesmo para acertar uma maldita lata. E aquele homem louco disse que: ou eu estaria com ele… ou estaria morto. Então eu disse que sim… Que estaria com ele até o fim.

Mas tenho sorte porque sou só o covardão da cidade. Sou o inútil… Sou o homem invisível. E ainda faltando uma hora pra meia-noite. Peguei um cavalo e todo tipo de suprimento que eu podia levar comigo… e vou dar adeus a essa cidade amaldiçoada!! Vocês deveriam vir comigo!! Venham!! Vamos, vamos todos! SERÁ UM MASSACRE!!

VI
JESSE JUNIOR

Reuni toda a família e sentamos na mesa da sala, com a luz apenas de uma vela. Demos as mãos e rezamos, esperando pelo pior. O que podíamos fazer? Não pude convencer o meu pai a sentar conosco. Ele ficou do lado de fora na varanda esperando algum milagre acontecer. Mas… O que um mendigo cego poderia fazer diante de um exército de LOUCOS? Mas como sempre meu pai estava certo… A resposta chegou, a meia-noite…

VII
O ULTIMO ESCRITO DO VELHO JESSE
(Parte 2)

O exército de Talbot estava prestes a deixar a delegacia. Munidos de rifles, pistolas e até mesmo granadas. O xerife queria as grávidas… mas os capangas pareciam ter decidido acabar com a cidade.

… Foi então que ELA chegou.

Seu cavalo veio em passos curtos e galopes charmosos. Parecia vir do nada. O som do cavalo misturando com o breve relinche, junto a respiração ofegante de quem o conduzia, ecoava por todos os cantos.

De repente o céu – que estava límpido – foi tomado de nuvens grossas e cinzentas. Uma garoa caiu e eu dei uma longa gargalhada. Todos os cidadãos correram pra perto, a fim de ver o que estava pra acontecer. Mesmo ignorando os conselhos do meu pai, que dizia:

Jesse, filho um tiro sempre pode chegar até nós mesmo quando estamos fora do tiroteio”.

Escondidos em pousadas e tabernas, os cidadãos viram a nova heroína que se erguia. A amazona desceu do cavalo preto que bem conhecíamos… portando uma Colt 45 (que também conhecíamos), que pertencia ao seu antecessor e mentor. Seus olhos também estavam vendados… e apenas EU soube exatamente quem era ela… E que tipo de espírito de vingança ela se tornara.

Um jagunço idiota disparou o primeiro tiro, que a fez agir rápido. Em poucos segundos vimos os homens de Talbot caindo mortos… ela corria com ligeireza disparando tiros certeiros. Quando apenas Talbot ficou de pé… completamente atônito e frustrado. Ela sorriu… E se aproximou de mim. “Você não envelheceu nada…”, “E você envelheceu bastante…”… Eu gargalhei. E ela voltou-se para o Xerife Louco. É… velhos hábitos dos Pistoleiros Vendados… deixar o pior por último.

O velho xerife estava tão alucinado e cheio de medo que não era páreo para a Pistoleira Vendada. Sacou a arma desajeitadamente e levou um tiro no braço e outro na perna… ajoelhado pôs-se a chorar e lamentar em nome de sua mulher e do filho que não nasceu.

O silêncio estava absoluto – tanto que podíamos ouvir nossas respirações – quando um maldito gritou “Mate ele! E imediatamente foi seguido pela multidão eufórica. Foi quando o velho mendigo… o antigo salvador, apareceu em passos curtos. Semblante exausto. Ele e sua sucessora se olharam.

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Corri até eles e meu filho correu atrás de mim tentando me impedir. “Chega de sangue! Ele está acabado!”, implorei.

A Pistoleira Vendada virou o seu rosto em minha direção, mas voltou-se ao seu professor novamente. Gaguejando eu perguntei, num tom de pura súplica: “Danielle ainda têm algo de você ?”.

E então o belo homem de olhos azuis me olhou com muita tristeza… balançou a cabeça negativamente, respondendo por ela a pergunta que eu fiz… e dando as costas em seguida. Todos então (todos os que não queriam ver a cena) acompanhamos os seus passos – num silêncio fúnebre. E então a Pistoleira Vendada disparou mais a bala que matou o xerife louco.

O céu clareou rapidamente… E quando eu olhei pra trás… Ela já cavalgava longe, misturando-se a névoa e a areia que subia.

FIM