ZUEIRAS DA VELHA VIRGEM

Não havia pessoa mais enxerida que a Véia Juana. Metia o bedelho em tudo. Nunca foi casada. Diziam que quando nova, simpatizava era com outras mulheres. No dizer do povo: sapatão. Contudo, na vila, era uma figuraça! Dava palpite na vida de casais, dedurava cachaceiros e amantes, xingava policiais corruptos;... por vezes, esteve detida por desacato. Andava mais rápido que a má notícia, falavam os detratores. Ainda assim, era estimada pela maioria.

- Vou te arrumá um macho Véia Juana!

- Vai tomá naquele lugar... seu escroto!

O Velho Totonho é que gostava de atentá-la quando passava na porta de seu boteco. Ás vezes, ela até entrava para tomar uma lambada... só de alambique. Etá véia retada!! Aos noventa anos ainda arranjava tanta disposição. Entretanto, o tempo é inflexível e passa para todos. Os primeiros sinais de que ela deveria quietar foram surgindo...

No domingo, a Véia Juana fora convidada para dar o pontapé inicial da partida de futebol entre rivais E.C. Passa Raiva X Clube de Regatas Vexame. Ela apareceu uniformizada com as cores do time. A galera aplaudiu, ela se empolgou. Desatou a correr de um lado pro outro dando olé na galera. Quando o juiz apitou o início do jogo a Véia Juana chutou a bola e caiu dura no terrão gritando de cãibras.

- Acudam! Socorro!!! Ai! Ai! Ai!

Felizmente, nada mais sério. Poucos meses depois surgiu a notícia de que a anciã participaria da Corrida da Morte de Moto-Velocidade que seria sediada ali. Mentira dessa gente! Ela só iria dar a volta inicial na garupa do Kid Voador a 320 km por hora. No dia x o povo foi lá pra ver.

- HIP HIP URRAAA! Vai lá Véia Juana!!! Viva!!!!

A inoxidável atleta foi devidamente amarrada na garupa do Kid Voador. Ao som dos fogos de artifício lá foram eles para a aventura. Soube-se que antes que a moto atingisse os 100 km por hora a velha já havia desmaiado ali atrás. Poucos minutos depois, quando Kid completou a volta e entrou no estádio equilibrando-se numa roda só, Juana já estava no mundo dos sonhos. Tiraram-na de cima da moto com os dentes trincados e a cor da pele verde. Dessa vez foi parar na UTI.

- Chamem uma ambulância! Coitada!

Depois disso, até os mais otimistas acharam que ela iria se aposentar dessas presepadas, porém, veio a época da vaquejada. O sonho de Juana veia era fazer a montaria. Tinha que ser um animal feroz, nada de delicadezas com ela não! Mesmo alertada das conseqüências, lá foi ela para mais um desafio.

Quando o locutor anunciou a presença de Véia Juana montando o Touro Satanézio, o assassino da Arena, a galera pirou!

- Ela vai morrer dessa vez! Vamos ter sangue na arena!

Mas, a invencível atleta conseguiu mais um feito dessa vez. Quando a porteira se abriu, em menos de um segundo, no primeiro pinote do Satanézio, ela passou voando por cima da cabeça de cento e cinqüenta espectadores na arquibancada. Foi aparada no colo do Negão Balú que já havia sido goleiro do Flamengo do Piauí e estava ali atento ao desfecho desse evento.

- Te aquieta Dona Juana! Cê ta caçano morrê!

Dali ela ficou três meses com dores nas costelas. Pensam que ela parou!? Entre tantas outras aventuras, ao chegar aos 100 anos decidiu realizar o sonho máximo: iria pular de paraquedas. Nessas alturas da vida a Véia Juana confessou que queria voar. Nunca queria ser enterrada no chão. Se pudesse voaria para sempre...

Tomou aulas particulares de paraquedismo. Contratou um piloto com um avião Teco-teco de dois lugares. No dia combinado lá se foi ela. O Céu de Brigadeiro, tudo tranqüilo... até que... de repente o piloto teve que fazer um looping (guinada de 360 graus) por causa de um maldito urubu que estava no caminho. A veia Juana tinha se esquecido de apertar o cinto e então... Meu Deus! Lá se vai ela despencando das nuvens! O paraquedas ficou a bordo do avião.

Tomado pelo pânico o piloto faz meia volta e, pasmem!,... a velha Juana, de braços abertos planava no ar feito uma gaivota. Dava piruetas e voava feito uma pipa chinesa, de olhos fechados contemplava a beleza do mundo. Estava feliz.

O piloto conseguiu laçá-la com um anzol e carretilha de náilon. Trouxe-a para a terra como se fosse um menino empinando um papagaio. Provavelmente o corpo magricelo da velha não permitiu que ela se esborrachasse no chão – pensava ele. Entretanto, quando puxou toda a linha trazendo o corpo da velha notou que ela não estava mais ali. Os olhos fechados, o sorriso de felicidade, a paz de sua alma indicavam que ela encontrara a felicidade que tanto buscava.

O piloto então tomou a atitude mais sensata que podia tomar: cortou a linha da pipa e deixou a velha Juana subir,... subir,... subir, até sumir no horizonte.

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Zé Nascimento