Pobres de ricos
Era frio, chovia lá fora, mas não impedia que o futuro herdeiro do trono nascesse. O palácio estava alvoroçado e os camponeses do pequeno povoado, ficavam cada vez mais ansiosos para conhecerem o novo integrante da família real. Ao soar o grande sino inglês do palácio, as cortinas se abriram e o pequeno Lispector IV foi apresentado com muita vibração, mas com menor prestígio por parte do seu primo Graciliano no qual queria ser o imperador daquele vilarejo. A população festejava, mas não imaginava que dias de atrocidades estariam iminentes.
Já crescido, Lispector IV estava pronto para assumir o trono e ser declarado imperador do povoado Drummond. Ele era jovem sorridente, demonstrava simpatia com o povo mais carente do vilarejo, mas esse perfil mudou instantaneamente ao chegar no poder, Lispector IV sempre teve o que queria e tratado sempre com muita fartura e conforto.
Com esses ensinamentos de berço visando sempre o melhor para si, a ganância e o orgulho ficavam mais evidente. O imperador aumentava os impostos repentinamente e constantemente com o objetivo de custear todos os luxos do palácio e grandes banquetes, no qual os camponeses não poderiam participar. Esse autoritarismo, vaidade e cobiça do imperador, elevou a pobreza no povoado e as pessoas começaram à passar fome e sede.
Os camponeses já estavam ficando desesperados pela ausência de sensibilidade do imperador, as pessoas começaram a morrer de fome, sede e o frio já não era tão hospitaleiro. Embora fosse difícil de se alimentar, o imperador fornecia lavagem que sobrava dos porcos para os mais pobres, sendo entornada no chão com extrema falta de hombridade.
Banquetes e comemorações eram vistos com muita frequência no palácio. Uma delas seria de extrema expressão no vilarejo e muito aguardada por todos, era o dia do Imperador. No dia anterior, viajantes de diversos povoados levaram diferentes peças de roupa para Lispector IV escolher. O palácio estava movimentado para que ocorresse tudo como planejado.
Porém, na boquinha da noite, a vestimenta real de pele de urso caiu pela janela e o vento juntamente com a garoa da noite o conduziu para uma rua silenciosa e vazia do vilarejo. Rapidamente, Lispector desce correndo às escadas e vai em direção à vestimenta, ao chegar no local o jumento se fazia presente com metade da roupa na boca. Antes mesmo que o imperador gritasse com o animal, sentiu suas orelhas grandes e o pelo de seu corpo havia se multiplicado. Tentou falar, mas o único som que ecoava era o relinche de um jumento. Seu dono o pegou, pois os guardas reais se incomodaram com o barulho, e foram em bora.
Ao passar a noite fria em uma velha casa, o jumento que era chamado pelo seu dono, um camponês de idade já avançada, por Assis, começara a trabalhar bem cedo. Antes mesmo do sol raiar, o jumento já estava sendo requisitado para andar até o palácio com o objetivo de pegar a maior quantidade de comida possível. Isso se deve, pois no dia da comemoração do imperador, a população era solicitada para adorar e gritar. Porém, o povo estava faminto e revoltado com tamanha injustiça, sendo calados com pães velhos e água não tratada.
Quando o jumento Assis chegou ao palácio, seus olhos ficaram vermelhos e a tristeza já se fazia presente quando observou que a família real não sentia a sua ausência e o povo aplaudia e gritava:
- “Viva o imperador”
Seu primo mais velho era apresentado como o novo imperador de Drummond. Graciliano era ovacionado, enquanto Assis era carregado com pães e garrafas de água. Quando as patas de Assis começou a ficar trêmulas, seu dono partiu para seu pequeno ranchinho do outro lado do deserto. O caminho era longo e cansativo, o imperador não era submetido à tamanho esforço e sentia bastante fraqueza.
Esse trajeto virou um caminho rotineiro para Assis, foram vinte anos de abandono, castigo devido às suas crueldades, ladeado de pobreza e fome praticadas por ele. A vida já não tinha cor e não era mais servida por meio de banquetes, se via apenas a poeira do deserto e o verde do mandacaru até sua vida chegar ao fim.