Amana, mágica cunhã

Amana a menina mágica

Aquela noite estrelada em que nasceu a indiazinha Amana, era uma noite diferente, escondia mistérios que ninguém imaginava. Um bebezinho frágil, sem beleza, se comparado aos demais da tribo, com o passar das luas tornou-se o coração do velho curandeiro, seu tamŭa – avô − . A mãe sentia, Amana era espírito especial.

Algumas manhãs, sempre às terças-feiras o velho Apoenã saía de sua uka e silenciosamente ia buscar Amana. Mesmo que a mãe se negasse a entregar a cunhã, ele iria levá-la. Mas por que se negar a entregar Amana a Apoenã? Ele a ama! Pensava silenciosamente Iandira, a mãe. Restava-lhe guardar sua desconfiança e acompanhar, ainda que às escondidas, o velho Apoenã.

O velho curandeiro tomava a indiazinha no colo e saia, como quem esconde um tesouro, por um caminho que cortava a mata levando o bebê até sua uka. Iandira, com seus passos de onça, acompanhava tudo às escondidas. Apoenã chegava a uka e por horas bebia seu licor sagrado, cantava cantos mágicos, acompanhado pelo maracá e pau de chuva. A indiazinha deitada num cestinho de talas de buriti brincava com os dedinhos.

De repente, Apoenã juntava gravetinhos de madeira fazia um fogaréu. Aquele fogo não era puro, Iandira pôde comprovar porque viu que Apoenã agradava o fogo com breu branco, espinhos de kuandü, folhas de caá e pó de alfazema. O fogo se entregava aos presentes do Velho Apoenã e embriagado liberava uma fumaça perfumada doce e misteriosa.

Apoenã tombando pelo efeito mágico do licor e do pó de alfazema que aspirava, caminhava cambaleando em direção ao cestinho em que Amana brincava. Do lado de fora da tapera Iandira acompanhava tudo, com muito medo pela vida da menina índia.

O curandeiro tomava nos braços a indiazinha e caminhava rumo o fogaréu que agora era apenas uma fumaça robusta. Ergue Amana e profere palavras mágicas passando a cunhã varias vezes pelo fumaceiro como se a pueril compusesse um ritual.

A menina naquele momento apesar de não ter idade para falar ergue-se e levanta-se como se fosse uma mulher. Canta músicas mágicas e do umbigo retira um pedacinho de bambu. A menina toca um canto mavioso, tudo para. Os pássaros calam, os macacos por um instante deixam de brincar nos galhos do pau, o veado ligeiro acalma seu passo. A anta mastiga a castanha como se fosse o último alimento ali.

A indiazinha toca como se seu destino fosse aquele. Canto triste, mas bonito... Apoenã agora pega um tambor feito com coro de onça e acompanha a menina com batidas tímidas...

Tudo na aldeia vira luz, tudo é festa. O amor entre os apaixonados é mais presente. kurumins brincam felizes no beira do grande Solimões. Os idosos relaxam de suas dores e sentem a paz em suas maqueiras, os homens enchem seus paneiros com caça, as plantações florescem. A presença de Tupanã estava ali, confirmada naquele mágico ritual. Amana era a presença viva de Tupanã naquela aldeia.