Primaguerra
Ao abrir a janela, o sol incidiu sobre a sua fronte e isso o deixou momentaneamente cego. O sol dando nos olhos, como Deus descendo majestosamente do céu no dia da glória, quem poderá olhá-lo de frente?
A aveludada relva do pequeno jardim ainda dormia sob o sereno que na madrugada caíra. Margaridas e hortênsias sorriam, pássaros cantavam. No varal desnudo pingentes de orvalho vibravam com a brisa. Num canto, a mesma aranha, broche perfeito na lapela da sua teia. Respirar aquele ar matinal era tragar a pureza do universo. O hálito do criador. Era primavera.
Sobre a cômoda desarrumada, o retrato de Josefina. Aqueles olhos quase claros, aquele olhar profundo e sereno o acompanhava em todos os seus movimentos.
Ela fora o epicentro das loucuras de amor por ele cometidas. Fora a sua musa poética, a sua luz nas trevas... Então, nunca se soube por que jamais ficaram juntos.
Para lá da pequena cerca os melões maduros sobre o capim ressecado e molhado do campo, pareciam centenas de pequenos sóis resplandecentes.
A montanha ao longe aos poucos ia revelando a sua magnitude à medida que a cerração se diluía.
O diabo, é que o mundo estava em guerra, e o rapaz, agora soldado, vestiu a sua farda, aprumou a sua pesada arma e saiu na incerteza de voltar.
José Alberto Lopes®
Out. 05/2012