[Movimento dos Barcos]

[Mais la vie sépare ceux qui s'aiment,

Tout doucement, sans faire de bruit

Et la mer efface sur le sable

Les pas des amants désunis]

_________________

A montanha, o mar, o sol, o vento;

Malas, gentes, luzes e os barcos —

A inteireza do mundo subtrai-se

Agora à nossa alma sensível.

Neste instante, os nossos olhares,

Antes ternos, mas agora impassivelmente diretos,

Esvaziados dos sonhos partidos e de gastas esperanças,

Não mais se juntam nos mesmos objetos.

Apenas saídos da nave que vogava ligeira e bela,

Desembarcamos em meio à agitação desse cais.

Atônitos, com os sentidos ainda bastante aturdidos,

E as mãos carregadas de incômoda bagagem,

Despedimo-nos com dois beijos de fria cordialidade —,

Um nada, perto de tudo que vivemos nessa viagem!

Tentando firmezas que sabemos impossíveis,

Demos as costas um para o outro e nos afastamos.

Caminhamos pela extensão do cais,

Ainda sem saber como serão os dias

Gastos em nos arrancar um do outro!

O peito aperta, sufoca, mas o que fazer,

Se a nossa nave mágica foi destroçada?!

A brisa nos seca os olhos e confunde em nossos lábios,

O sal das lágrimas e o sal do mar — a dor e a distância!

E enquanto caminhamos, nossos olhares se consomem,

E se perdem no que há de real nesse instante:

O incessante, o "eterno movimento dos barcos"!

E no sem-fim desse cais, iremos sumindo, sumindo...

Até nos perdermos entre as gentes e as coisas, outra vez!

[... e assim, tentarei apagar de minha mente a sensação de que,

em algum lugar do tempo e do espaço,

havíamos sido preparados um para o outro]

____________________

[Para Ana Lucia, em algum dia de 1997]

*****

[Hoje, eu não escreveria tal coisa, pois, corridos os anos, aprendi que a real despedida é muda como as pedras de um muro, é feita de silêncios... mas o que escrevi, escrevi, aí está!]