O aprendiz
Um grande poeta escreveu: Fazer poesia não é uma vaidade que eu tenho, é minha maneira de estar só.*
É um paradoxo, disse o mestre ao seu aluno. Na verdade o poeta nunca está só, ao contrário ele está com todas as coisas, com todas as pessoas, ele está no futuro , está com suas memórias. Mas paradoxalmente ele precisa estar só, no sentido de estar completamente em si, ele precisa estar onde está o seu coração. Precisa-se se pertencer absolutamente para poder estar em todas as coisas.
Meu jóvem, disse o mestre se desejas tornar um poeta de verdade
não basta saber escrever ou conhecer os grandes poetas, e dominar a habilidade de brincar com as palavras. É preciso apurar sua sensibilidade. O paladar, por exemplo, sinta o gosto da comida que comes, de cada uma em particular, de cada fruta, sinta a alma da água. Mastigue os líquidos, beba os sólidos. Apure também teu olfato, experimente o cheiro da vida; Sinta o perfume de cada flor, descubra que cada pessoa tem um cheiro particular. Sentir com as mãos é uma experiência maravilhosa.Toque devagar todas as coisas, toque o pão, toque todo o corpo de sua amada, toque teu corpo; Ouça todos os sons, descubra o que lhe parece inaudível, o som do sangue batendo nas paredes das artérias dela e nas tuas. Ouça a voz do silêncio e daquilo que ainda não foi dito; Ouça a música do vento.
Áh! os olhos, que janelas maravilhosas por onde entram todas as cores, todas as luzes. Olhe nos olhos das pessoas, de todos os seres que cruzarem teus caminhos. Contemple o por do do sol, veja todas as cores de uma aurora.
Sinta a luz e a sombra, a alegria e a dor, a chuva e o sol, o amor e a solidão. Viva intensamente, com todos os sentidos.
Somente assim terá acesso a matéria prima da poesia.
Viva poeticamente.
O resto é vaidade.
* F. Pessoa