CONFORTO

Agora pouco,bem no meio da tarde, uma árvore na extremidade da rua se deixou entremear toda pelos raios de Sol e, por um longo instante,brilhou como árvore de Natal fora do tempo.O instante passou, como passa todo instante e o pequeno milagre desvaneceu. Foi como a figura magnífica surgida de repente no giro do caleidoscópio, desfeita por um leve tremor de mãos.Uma bolha de sabão. Aquela ave -nuvem, que acabou de perder uma das asas.O último acorde desta música, no aparelho-de-som.

Confortam-me as primeiras flores da paineira sob o céu deste início de outono, da paineira diante da janela desta sala.Conforta-me a quase possibilidade de um imprevisto instante azul na paisagem cinza que me está por dentro.Conforta-me o universo do amor que trago em mim, do qual talvez nada mais saibas, o universo do amor que, talvez já completamente ignorado por ti, continua o universo do amor que trago, para sempre, em mim.