CONFISSÃO

Ao longo dos anos,

(agora tenho consciência),

desperdicei muito do meu presente,

que não sabia tão precioso,

esperando avidamente

por venturosos futuros,

futuros que me chegavam diariamente

e que eu os transformava em passado

sem usufruir de forma plena

de tudo o que me tinham para oferecer.

Que fiz dos meus hojes?

Na minha angustiada espera de amanhãs

não os vivi como deveria

e agora, para minha tristeza,

tenho, nos arquivos da minha alma,

uma enorme coleção

de ontens, vazios e obsoletos,

dispostos desordenadamente

sem datas ou referenciais

que me permitam acessá-los

para garimpar neles o que sobrou de bom,

ou mesmo deletá-los...

Ai de mim! nada mais posso fazer

para corrigir minhas falhas

e, então, ter o que não tive,

sentir o que não senti,

falar o que não falei,

cumprir o que não cumpri,

chorar o que não chorei,

sorrir o que não sorri,

amar a quem não amei,

reconstruir o que destruí

plantar o que não plantei

colher o que não colhi,

perdoar a quem não perdoei,

e viver o que não vivi...

Ai de mim! Mas aprendi com meus erros..

Agora,

embora tardiamente,

tenho plena consciência

de que nos eternizamos nos ontens,

pois a história não é feitas de amanhãs

mas sim de hojes

quando transformados em ontens,

mesmo os vazios...

(Belém – Pará, 1998 - Cantigas de outono)