As flores ensinam a viver

Prólogo: possivelmente este será mais um texto incompreendido.

Todavia, com as flores aprendi a compreender o incompreensível,

a aceitar o inaceitável, a acreditar no inusitado e inverossímil,

a ter ouvidos seletivos, a praticar as virtudes teologais.

A menina-moça dormia e sonhava... em seus devaneios ela via um homem muito velho e que aparentava pelo menos 87 anos de idade! Há algum tempo ela sabia que os idosos têm mais experiência, são mais sábios, mais tolerantes, menos preocupados com as coisas comezinhas do dia-a-dia.

Ao lado da moça, um namorado apático, saciado pelas delícias da carne jovem da bela e tenra mulher, indiferente aos acontecimentos intricados da mente infantil e sonhadora, não imaginava ser possível aprender algo de bom durante um sonho.

A jovem, em enlevo sublime, após as quimeras do amor, agitava-se na cama espaçosa, entre lençóis de cetim alvos e perfumados, quando a chuva embalava seu sonho colorido e estranho.

Ela estava indiferente ao companheiro pachorrento que ressonava de ventre ao ar, lívido e com um suor frio que porejava da pele alvacenta, refestelado e exausto pela posse corporal recém-consumada.

No sonho, do qual não queria acordar, a menina morena, muito jovem, perguntou ao homem de barba e cabelos grisalhos, bem-conformado, desconhecido, extremamente velho, embora parecesse saudável,

sendo capaz de proporcionar ao espírito de quem o procurava inexcedível vantagem e bem-estar:

“Como faço para não me aborrecer? Entre mim e os outros há o abismo do inexplicável; algumas pessoas falam a menos ou demais, são tediosas, estúpidas; outras são ignorantes e indiferentes com o progresso profissional e o estudo; sinto ódio das que são mentirosas e desleais. Sofro com as que caluniam e/ou tentam se aproveitar das pessoas idosas, das crianças e animais, dos mais fracos e oprimidos. Não aceito os desmandos, o descaso e rebeldia dos mais jovens”.

- Pois viva como as flores - Respondeu e admoestou o ancião!

- Como é viver como as flores? - Perguntou a menina de olhos vivacíssimos.

- Repare nestas flores. - Continuou o velho, apontando lírios que cresciam no jardim. - Elas nascem no esterco, entretanto, são puras e perfumadas. Elas extraem do adubo malcheiroso tudo que lhes é útil e saudável, mas não permitem que o azedume da terra manche o frescor de suas pétalas. Elas são especiais, são seletivas! Seja assim também.

É justo angustiar-se com as próprias culpas, mas não é sábio permitir que os vícios e/ou atrasos dos outros a importunem. Os defeitos deles não são os seus defeitos. Se não são seus, não há razão para aborrecimento. Exercite, pois, a virtude de rejeitar todo mal que vem de fora.

Não se prepare para os tempos de facilidade e abastança, mas para os dias de necessidade e carência, de modo que a incapacidade, o sofrimento e o ódio não a mutile.

Não esqueça jamais: Às vezes nos falta esperança, vence-nos a ignomínia que barbariza e nos desumana, conspurcando os ideais, maculando pensamentos sãos, escanifrando rostos e secando olhos melífluos. No entanto, quando não esperamos, como dádiva sublime e magnânima beatitude, mesmo que seja através de um sonho, alguém aparece para nos confortar.

Seja seletiva e pratique as virtudes teologais: "Fé, Caridade e Esperança". Isso é viver como as flores!

Nessa ocasião o ar estava perfumado, a menina-moça tranqüila, os primeiros raios de um sol radiante anunciavam um esplendoroso alvorecer. Quase inaudível um som sublime, à semelhança de "It's in the rain" (Enya), envolvia toda a atmosfera energizante.