Como o vento II
Há um ruído constante sob a pele,
um murmúrio antigo que não se cala.
Carrego tempestades nos olhos
e calmarias falsas no peito.
A cada passo, deixo rastros de mim —
fragmentos que ninguém nota,
mas que sangram.
Meus dias são feitos de retornos:
volto a dores que não cicatrizaram,
volto a sonhos que nunca acordaram.
Não sei permanecer,
mas também não sei partir por inteiro.
Minha alma é feita de migalhas,
e mesmo assim, insiste em servir banquetes
a quem não tem fome.
Às vezes amo como quem pede socorro.
Outras, fujo como quem quer ser encontrado.
Não é covardia — é exaustão.
Já gritei tanto em silêncio
que hoje minha voz soa estranha,
até pra mim.
E quando a melodia sussurra,
meu espírito responde,
porque dentro de mim mora o vento,
e ele nunca para de soprar.
Ele me arrasta para longe, mas devolve ao mesmo lugar,
me sopra promessas, mas também me deixa no eco da incerteza.
Sou o vento.
Nunca aprendi a parar.
Desaprendi os lares, os portos, os pousos.
Eu passo — às vezes devagar,
às vezes como quem pede socorro sem dizer.
Sou leve quando quero ficar,
mas carrego demais pra permanecer.
Não faço barulho de propósito,
é que a ausência me pesa tanto
que às vezes sopra alto.
Não sei ser abrigo,
mas tento ser presença.
Mesmo que doa.
Mesmo que passe.