O cântico dos grilos

Nas noites sem pressa, quando o mundo se despe das urgências sem sentido e as sombras se alongam sem dono, até o infinito, os grilos cantam. Cantam porque sim, cantam porque não, cantam porque podem e, sobretudo, porque é tudo o que sabem fazer: seu cântico preenche o vazio da escuridão sem pedir permissão, sem buscar aplausos, sem se importar se alguém escuta ou não.

Nos quintais indiferentes, onde os ventos carregam segredos que ninguém se importa em decifrar, os grilos entoam seu hino sem alegria ou tristeza. Não importa para eles se a lua cresce ou mingua, se um coração se despedaça atrás da janela ou se uma amante espera por uma resposta que nunca virá. O cântico dos grilos não se curva para a dor, nem se exalta na festa. Ele apenas existe, contínuo, imparcial, sem começo nem fim.

E o mundo gira, efêmero. O tempo escorre e os homens choram, sonham, matam e esperam. Os grilos? Não sabem de nada disso! Cantam na chuva, cantam na seca, cantam sobre túmulos e sobre berços, mas a melodia é sempre a mesma - para os enamorados e para os esquecidos. E bendita seja essa indiferença! Bendita seja a voz dos grilos, que nada promete e nada nega. Que não julga, não consola e não lamenta, apenas persiste, como um eco do universo, o pulsar vibrante de um coração sem dono.

E segue a noite, e segue a vida. Enquanto homens e mulheres buscam significados, os grilos apenas cantam.

Betaldi
Enviado por Betaldi em 14/03/2025
Código do texto: T8284850
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