Sons do silêncio
Quando às vezes nas horas tardias fico a ouvir o silêncio, sinto que ele experimenta solidões, tal como um candelabro que se tortura prazerosamente com o calor e os restos de vela derretida, somente para ver a beleza das chamas iluminando o espaço.
O silêncio tateia a derme das ilusões, numa forma de ternura e leveza, só pra mostrar quietudes e permitir viagens emocionais.
Abro a janela enquanto a cidade dorme estirada em suas avenidas, com os pés cheios de asfalto e as mãos sobre as marquises dos prédios, como que cobrindo o rosto, se protegendo da luminosidade das lâmpadas suspensas nos postes.
Um leve vento ousa fazer coreografia com folhas secas na frente do meu jardim. Fico imaginando qual canção está a tocar para esse bailado tão elegante, já que as folhas verdes, novas, seguras pelo cordão umbilical nos galhos farfalham como se aplaudissem suas ancestrais se definhando felizes.
Vou dormir. A noite é um deserto de improbabilidades e receios que quase se acaba depois dos muros de cada residência, no conforto de cada quarto. Infelizmente os que se deitam lá fora se martirizam a beira dessas incertezas.