Paradoxo

Minhas motivações são diversas,

assim como minhas urgências.

Hoje, por exemplo, escrevo como um grito preso na garganta.

Falo através do que escrevo.

Falo para ninguém,

mas com a necessidade de falar para tantos.

Uma necessidade que não compreendo,

mas que inquieta as mãos, formiga o corpo,

me aproxima de mim e, ao mesmo tempo,

me afasta das coisas e das pessoas.

Ainda assim, vejo a irrelevância de tudo isso.

É emancipador e decepcionante.

Queria outros como eu.

Outros que partilhassem desse idioma morto.

Outros que corressem para o mesmo campo,

a mesma caverna que eu.

Pois chego lá e estou só.

Hoje, queria respostas.

Por que preciso escrever?

Não é bonito como parece;

é, na verdade, angustiante.

É como um despertador que te atravessa

com aquele som agudo.

E você, ainda atordoado,

sem ter dormido o suficiente,

é obrigado a acordar.

Esse impulso é como uma farpa no dedo,

que incomoda até ser retirada.

Aqui, eu berro.

Atuo.

Danço.

Sou o cisne negro.

Canto.

Brinco de ser.

E posso não ser coisa alguma.

Liberdade, essa que não possuo no palpável.

Aqui, é a sala do pânico

que não consta na planta da minha construção.

Nunca estive tão próxima de tocar a plenitude

e, ao mesmo tempo, tão perto de ser minúscula e irrelevante.

Como um equilibrista embriagado,

me balanço nessa corda tênue

entre o êxtase e o vazio de apenas conseguir ser eu

nesse lugar que inventei.

Essa parte inacessada é a parte crua,

onde está fincado meu fruto maduro.

Aqui, é raiz firmada em rochas submersas e invisíveis.