Implacável
O tempo não pede licença; ele entra.
Se acomoda na sala do peito, cruzando as pernas como quem não tem pressa, embora seja ele o mais urgente.
Nos espelhos, deixa rastros de sua passagem - linhas no rosto, sombras nos olhos e memórias que já não sabemos se são ruína ou refúgio.
Implacável é o pulsar da vida, que não cessa mesmo quando o cansaço pesa.
É o vazio que fala mais alto, o silêncio que ecoa quando a multidão vai embora.
A existência, na sua essência, nunca barganha. Ela dá e toma, em proporções que não nos cabem calcular.
Buscamos sentido, e ele escorre entre os dedos.
Tentamos domar o instante, mas ele morde, selvagem, antes de se desfazer.
O medo? É só o reflexo do amanhã que nunca chega como planejamos.
E ainda assim, seguimos.
Porque o implacável também nos ensina: na transitoriedade está a beleza; no fim, o começo. E na dor de existir, o milagre de estar.