Ciclos do Tempo
Acordo sempre com o coração descompassado – várias batidas aceleradas, um tremor sutil nas mãos. Como se o fôlego consciente me sacudisse, dizendo: Acorda! Novo dia, de novo…
Os olhos se abrem de repente, e a primeira coisa que buscam é o relógio. O tempo tem brincado comigo. Parece consumir-se cada vez mais depressa. Estamos em uma competição injusta: ele sempre avança, e, por mais que eu tente, ele, solitário, sempre me ultrapassa.
O café desce, arrastado pela garganta. Quando percebo, já se passaram 25 minutos desde que meu dia começou. Um banho rápido me desperta, mas antes de sair de casa já sinto o calor, o suor, o cansaço outra vez. Olho em volta, e tudo parece em ordem, mas há uma ordem vazia. A pia limpa, a louça lavada, o chão brilhando… E o gás? Sim, desliguei.
Meus filhotes já espalhados pela casa tomam o sol que entra pela varanda. Por um instante, me vejo deitada com eles, o sol aquecendo minhas costas enquanto o mundo está em silêncio. Mas logo me lembro: preciso correr.
Passos acelerados deixam para trás os olhares tristes dos que vão passar o dia me aguardando, e, com o coração apertado, já anseio estar de volta.
O caminho até o trabalho é longo, e, sinceramente, tem dias que nem percebo como cheguei. É uma rota automática, e minha mente foge enquanto meus músculos já sabem o que fazer.
Chegando lá, meu dia começa de fato. Naquela sala, naquela mesa, pensando, criando, resolvendo. Dou tudo de mim, faço o tempo valer. E o relógio, continua me desafiando.
Quando dou conta de mim, já são 14 horas, e meu estômago me lembra que sou de carne e osso – e faminta. Mastigo, bebo, converso, rio, e volto para ela. A mesa. Grande, imponente, cheia de marcações e anotações. Me encontro em cada pedacinho.
Meus dedos batem acelerados, marcando palavras, desenvolvendo ideias, enquanto penso também no que preparar para o jantar. Enumero mentalmente passos e tarefas que preciso seguir ao retornar, pois a ilusão do controle me dá um certo alívio. Mas, ao chegar, dificilmente sigo os planos pensados mais cedo.
Divido-me entre mãe, filha e esposa, certificando-me de que todos estão satisfeitos com o que posso oferecer. Os alimento, e, quando olho para ele, ingrato relógio, já marca 22!
Meu banho agora é mais demorado. Deixo a água quente cair sobre meus ombros, uma tentativa ilusória de deixar escorrer para o ralo todo cansaço e agonia.
Saio mais leve, mas não o suficiente. Luto contra o sono, me alimento quase em silêncio, mas ainda tentando ser a companhia de alguém que também precisa de atenção. Tudo o que eu queria era o abrigo dele enquanto espero o corpo digerir, mas me recordo que o abrigo ali sou eu.
Amparo fraquezas alheias enquanto tranco as minhas em um quarto escuro. Ali elas ficarão em silêncio, assim como um barco repousado em um lago.
Me levanto quase sem forças, escovo meus dentes de olhos fechados – dizem que é ótimo para a memória. Seco o rosto, soltando um suspiro aliviado. Mais um dia se foi.
Quando olho as horas, o tempo me surpreende com sua crueldade, marcando 1 e 20 da manhã.
Todos os dias, não importa o quanto eu corra, o quanto eu planeje, programe. Ele sempre me ultrapassa. Ele corre, implacável, e eu fico atrás, sempre tentando alcançá-lo, mas nunca consigo. Isso é tão frustrante.
No meu travesseiro, já no escuro, me perco num campo florido de margaridas e girassóis, onde cada passo me leva mais longe da realidade. O aroma suave das flores me envolve, e uma brisa refrescante me toca.
Mas lá fora, o relógio continua seu tic-tac incessante, engolindo o tempo que tenho para recarregar o que resta de mim.