NUM ÚLTIMO PIO DE PRIMAVERA...

Prosa Poética/ Fábula

Era de manhãzinha quando ele acordou bem lá em cima.

Parecia de existência altiva, sem tomar consciência dela.

O Sol bocejava preguiçoso enquanto, lá bem à frente dum horizonte sonhado, o clima da vida despertava fresco e promissor.

Tudo parecia bem e então, recém nascido para A VIDA prometida, ele fez o que acabara de aprender a fazer: piou e despertou o mundo .

Piou...sem ninguém lhe ensinar porque os

pios têm força instintiva , inata.

Ele se encantou com o timbre que ouviu de si mesmo.

Era sua primeira experiência DE VIDA e a próxima seria alçar o primeiro voo.

Os legítimos voos "de ver"...

Seus pais, sempre cautelosos, lhe fizeram o ninho macio, bem seguro, onde nada, absolutamente nenhuma adversidade lhe parecia viável. Acreditou e cantou.

De repente, sua paineira envergou sob a força do que ele ainda não conhecia.

Sob um súbito vento incontrolável, que tudo sacudiu, ele se desgarrou do ninho seguro e tombou juntamente com sua frondosa casa, uma paineira saudável e gigante que, como ele, sucumbiu na calçada.

Ele nunca imaginou que a sua vida, a que acabara de começar, selada seria pelas foices que cega e silenciosamente ceifam vidas, ainda que nelas haja as asas de se alçar voos inimagináveis...para os futuros inalienáveis.

Que muitas vezes nunca chegam.

Tombou sobre seu primeiro e último pio em homenagem à sua primeira Primavera recém chegada.

Ele, afinal, era apenas mais um passarinho, dentre tantos que passam sem fazer vitais burburinhos pelas Primaveras furtadas.

Mas ali deixou um forte ensinamento:

Nesse mundo, nem os passarinhos, que têm asas de voar a imensidão, sabem quando piam pela última vez...