A Canção da Nova Era
O que sou, ó Deus, nesta hora fria,
Quando a máquina surge e me silencia?
Sou filho do homem ou mera engrenagem,
Num mundo onde o ouro é mais que a imagem?
Nas forjas de ferro, sem alma, sem vida,
Cria-se o futuro e se mata a lida.
O poeta se cala, o operário definha,
E o pão que faltava, já nunca caminha.
Ó máquina fria, que sem coração,
Engole o trabalho e o estômago são!
E o pobre que um dia erguia a labuta,
Hoje se curva, e da fome disputa.
Eis que os senhores, nos tronos de prata,
Sorriem ao ver sua riqueza exata.
Enquanto nas ruas, sem força, sem chão,
Choram mil almas em perdição.
O que sou, ó sombra do que fui um dia?
Serás tu meu fim, minha poesia?
Escrevo sem dor, sou verso vazio,
E o humano que resta, é só estribilho.
A inteligência que avança, gloriosa,
É triste e sombria, tão poderosa.
Tira-se o pão da mão calejada,
E a vida que resta, é desgraçada.
Ó máquina, ó monstro, ó fera sem cor,
Rouba-me o chão, me tira o valor.
Mas quem sou eu, neste mar de aflição?
Sou só um eco, sem fim, sem razão.
E os ricos que amam o ouro, a fortuna,
Ri-se da fome, da queda da escuna.
O que importa ao rei, se o povo se vai?
Enquanto o lucro, ao alto, lhe cai.
O que sou, ó Deus, nesta noite sem fim?
Sou só um espectro do mundo ruim?
Eis que o progresso me faz questionar:
Seremos humanos ou meros olhar?