Dharma
O que se curva o meu destino se a linha reta da tragédia segue firme? Em direção a um prato ora vazio, ora cheio. Mas cheio com o banquete podre da desesperança, exaurindo das entranhas. Sigo sobre a linha tênue da teoria do caos: as premonições seguem indubitáveis, nessa névoa pouco acima do meu nariz.
Respiro um pouco de clareza, quando no banho, reflito. Desce a água... escorre como sempre escorreu, mas um medo paira os sentidos. A apatia se mostra na cela dos azulejos brancos, como se quisesse tatear uma espécie de sentido, de propósito para a existência. Sinto a doçura da saliva tornar-se amarga pelas tantas infâmias que eu disse. Nostalgia em linguagem do meu passado: palavras tecem homicídios na ilusão do palato da verdade.
Nem a apatia e nem a saliva se comparam à cegueira escura que habito. Dou passos vazios na minha realidade deprimente. Vejo apenas o meu destino na linha negra, traçada com o meu sangue em seu contorno. A linha que se desenha um coração, mas este, asfixia qualquer chance de vencer. O meu destino é cármico, nada pode me resgatar. Estou na elucubração de um devaneio áspero — sair para fora de si, abandonar a carcaça balbuciada pela luxúria dos vermes. Estampar o último grito nas esferas do cosmo.
O coração enrola o meu pescoço e pergunta-me se a melhor decisão é essa. Respondo com minha ascensão de lágrimas e chega então a colheita da morte.
Como num ímpeto de coragem encontro a força para cortar a linha. Sou um soldado decomposto, mas ainda não morto por tudo o que me ocorre. Levanto e narro a história de um homem amaldiçoado e com peremptória clareza do sofrimento, a cegueira lume.