Carta de Libertação IV
Sino
O sino toca. Exatamente naquele mesmo lugar. E sair correndo não é suficiente para espantar o temor das últimas horas. E aquele que vem aí não é capaz de dizer as derradeiras palavras; o espetáculo será um fracasso, não é, Derquagot? O que tu fazes? Para de correr, Derquagot! Para porque assim tu aceleras o tempo! Tu não vês, Derquagot?! E por que tu sumiste?
Nada é como o tempo que não rende, e que torna a pressa maior do que tudo. A nuvem negra, então, é a figura preferida de quem insiste em se esconder detrás de falsas escutas. Nada melhor do que encontrar um guarda-chuva no meio da esquina mais próxima pra poupar os olhos de lágrimas tão doídas. Tu ousas parar a chuva lá em cima, Derquagot? Falsas mãos tentam nos agarrar e fazer-nos segurar fios de iniciativas que se confundem num futuro próximo. Mas o sino é invencível, e faz questão de continuar a sua música que nenhum falso cristão gostaria de ouvir. Isto marca as nossas horas como ferro em carne viva; queima, mas ainda bem que a fumaça não invade tudo.
O que realmente importa está simplesmente dentro de nós. E não adianta oferecer migalhas, pois o sino marca o compasso do dia a dia. E sempre ficam para trás, Derquagot, aquelas migalhas que deveriam estar em nossas mãos. Às vezes não sei quem compra todo este desânimo. E nem adianta virar a cara, Derquagot! Somos apenas pedaços do amanhã que nunca chega. O trem negro da nossa vida já passou detrás daquelas montanhas desconhecidas.
Mas a festa dos compadecidos continua. Sempre ou agora? Quem parar o sino quebra os dissabores diários de quem nasceu poeta. Aqueles que ferem a alma num desabrochar constante de palavras. E o sino continua seu badalar... Mas para quem? Para tu, Derquagot? Só te digo, amigo, para que não te preocupes já que dias mais coloridos estão por vir...