Uma caricatura de mulher
O que você deixou foi uma caricatura de mulher. Ela não anda, ela não levanta, ela não sorri. Ela está atormentada pelos fantasmas que você ainda deixou por aqui. Ela se olha no espelho e retrai. O olhar não brilha, o colo é flácido, as cicatrizes são escuras. Ela desliga a luz toda vez que tem que estar nua. Ela vagueia pedante da sala para o quarto. Ela te odeia.
Ela virou uma das vozes presas nas paredes. Com uma tormenta infinita, ela é o pó que a vassoura varre todos os dias. Ela dança ao som da decomposição, cai mil vezes, se espatifa no chão.
E se reúne, cada vez num remendo pior. Cada vez colocando pedaços que não estavam ali previamente. Um caco das suas palavras afiadas, que não se encaixa, mas que ela acha espaço. Mesmo que o incorpore como uma facada. Ela assumiu a sua verdade. Ela espera que isso possa trazer sua paz. A mesma que ela foi incapaz de dar antes.
A caricatura não tem nada de relevante. Doravante será esquecida. Não tem prospectiva de futura companhia. É uma mulher vencida. Esqueceram de lhe desenhar um coração, mesmo que incompleto. Eventualmente, se mesclará com o que é concreto.