Travessia das formigas

Naquele velho banco de madeira, entre a vastidão do cotidiano e o incômodo que minhas costas murmuravam, percebi os minutos se enfileirando com grande afinco. Em um silêncio de compositor, com os olhos de uma criança curiosa, fitei aquele instante como o último de um corpo que logo se tornaria memória, ruína presente na essência da vida que tanto relutamos.

Entretanto, à noite vencia o dia, e a noite é personagem dos contos antigos, que faziam as crianças soluçarem tanto de medo do que ela poderia representar. Não posso me perder na sutileza dos versos, ao menos, tenho que guiá-los, pois o deleite é efêmero, mas tão prazeroso quando bem descrito. Talvez não seja o meu caso, sinto-me intimidado quando escrevo, sim, intimidado. O leitor pode acabar criando histórias sobre esta reflexão, mas seria um fardo doloroso carregar esta angústia comigo. Chega. Isto não tem a ver com vocês.

Após minha intromissão com uma série de pensamentos involuntários, notei dezenas de formigas em uma travessia árdua, bastante trabalhosa para seres tão ínfimos. Seres que carregavam em si folhas verdes picotadas. Elas são engenhosas, em um movimento totalmente desengonçado. Estava comovido ali, era como se eu fizesse parte daquela reunião tão fabulosa, um sentimento se apossou da janela de minha alma que evidenciou em lágrimas de felicidades. Eu me senti completo por um instante. Espero que o leitor possa sentir também um cadinho. Voltei a fitar o céu, céu que mostrava suas estrelas brilhantes para seus espectadores.