Vazia Tarde no Parque

Silêncio de sombras no chão,

Estrelas escorrem cadentes,

Lambendo cometas irmãos.

 

Eu e minha dor respiramos a existência,

Cadenciados contra este existir cotidiano,

Cheio de regras, amarras, correias.

Quero liberdade sem sangue no chão!

 

As vozes que escuto nas ruas,

Me trazem as ardências das almas humanas,

Que cheiram, que riem, que fedem, que choram,

Querendo chegar a algum lugar.

 

Aprisionados em nossos corpos humanos,

Sonhamos em ser o que não somos.

Que terror só viver uma vida,

Ela ser feliz, mais terrível ainda...

 

Mas é só isso, no fundo, o que quero:

Quero paz bem dentro de mim,

Mas vem algo um tanto quimera

Me fazendo cair sem sentir.

 

Viva vida violenta!

Escorrendo garrotes guerreiros,

Escotilhas de poros parados,

Transpirando o suor esgotado.

 

Vou descendo de mansinho o dia a dia,

Me perdendo na manhã da picardia.

Não posso sentir mais um suspiro

Sem saber que minha boca é visceral.

 

Lágrimas nos olhos dos revoltados,

Sorriso no rosto dos desalmados.

Pique-se com seu sangue HIV,

Volte-se pra dentro de você.

 

Nada na ousadia do ventre do nada,

Nada na moradia da alma parada.

 

Viva violência da mão esgotada!

De suspirar suor em pele gelada.

Quero um dia de vida ingerente,

Sem paletó, nem sotaque espanhol.

 

Quero livrar-me dessa carcaça fedida,

Me valer do meu lado animal.

 

Nada, poesia contra a corrente do tempo,

Porque o poeta é o senhor do relógio.

E a poesia aponta pro túmulo,

Onde tudo é nulo, sem ar, nem revolta.

 

Não quero a vida dos felizes desgravatados,

Nem a covardia dos loucos desesperados.

Só quero sangue passando na veia,

Minuto a minuto, escorrendo, incendeia.

 

15/11/92

Marco Lirio
Enviado por Marco Lirio em 31/05/2024
Código do texto: T8075492
Classificação de conteúdo: seguro