Chávena de Chá de Hortelã
Os gatos molham-se na chuva. O macho morde a fêmea no pescoço. É o cio. A gata se deita com a barriguinha pra cima. Quer brincadeiras. É muito novinha. E a chuva cai como quem quer molhar-se toda - o parapeito da janela brilha com as gotículas dos seus respingos, as jardineiras desprendem o cheiro de terra úmida... As margaridinha balançam-se ao vento geladinho... Tenho uma imagem na retina; a memória que devolve alguns pássaros migratórios, sempre à tardinha: E a menininha alisando os pêlos dos gatos lá na fazendinha do vô Jô Monte. As coisas emergem como se quisessem despertar no silêncio acústico da chuva. O gato tenta enlaçar a gata com a sua mordida de amor. Mas a bichinha reluta, reluta tanto, tanto... Mas não deixa mais a barriguinha à mostra e cede. Os sons se confundem: A água vinda lá do céu e os murmúrios plangentes dos gatos. E nesse bloco sem linha, nada se retrata. Tudo fica na memória. E a fumaça se esvai fazendo espirais. Essa chávena de chá de hortelã veio mesmo à calhar.