Poema siamês
o que pode
o poeta
e sua poesia
que alfineta
duras e
surdas
pedras?
(clarins
e trombetas
e poeiras
de escombros)
o que pode
o seu
discurso
afastado das
amenidades
engodos?
(assombrações
mortas-vivas
ainda hoje)
o que pode
e o que não
pode ser
escrito
para o
conforto
dos olhos?
(o futuro
em cárcere
enseja
liberdade
pleiteia
cessar-fogo
granjeia
migalhas
para a
sobrevida)
o que pode
ser feito
pela paz
retórica
de antagonistas
e suas
palavras
de entrechoque?
(bestas
feras
indomadas
adornadas
pelo santo
manto do
sadismo
espalham
bençãos
de horror)
O que pode
a norma
culta
acadêmica
prover
socorro
aos desvios
de sentido
e à polidez
diplomática
que festejam
a barbárie?
(a brutalidade
deita-levanta
de pantufas
pijamas
com estampas
do Mickey Mouse
brinca de
rei e rainha
toma chá
pontualmente
às dezessete
horas)